Post do MGen Pedroso Lima, recebido por msg:
Fontes Pereira de Melo (1819-1887) já foi objeto de um post, em 12 de julho de 2012, da autoria do coronel Pena (para ver, clicar aqui) que teve a particularidade de ser suficientemente interessante para suscitar 5 comentários, o que constitui uma raridade neste Blogue.
Recentemente tive o gosto de ler as Memórias de Bulhão Pato (1828-1907), contemporâneo de Fontes Pereira de Melo que constituem uma narrativa muito interessante da sua época e que contém um capítulo dedicado a Fontes Pereira de Melo, já escrito depois da morte do grande estadista e que contém uma visão e apreciação da sua ação extremamente originais e que, pela sua qualidade, passo a transcrever na íntegra, pois achei que este escrito por si só daria um excelente post para este Blogue.
Vejamos o que nos diz Bulhão Pato:
“ Rodrigo da Fonseca Magalhães tomara conta da derrota política e seria cabido o equívoco, se derrota quisesse dizer – desbarato! O velho estadista, a meu ver, foi fatal! António Maria de Fontes Pereira de Melo manobrava ao catavento. Moço, resoluto, ambicioso de glória e de mando; de inconcussa probidade; parlamentar eminente; insinuante nas maneiras e na figura. Um pouco mais alto que o vulgar entre nós; delgado, sadio, ativo, vontade decidida e tenaz; olhar penetrante; sempre no seu posto; sem perder jamais o aprumo e guardando restritamente as chamadas conveniências. Apurado no trajo, acompanhando as frases cintilantes e espontâneas com o jogo da fisionomia e o gesto expressivo. Previdente. Assimilando todas as ideias que lhe pareciam úteis, e esse era o seu principal talento; confiando em si, mas conhecendo-se – não quis nunca rever um discurso; sabia que lhe faltava colorido e cunho literário. Imperativo, conquanto extremamente cortês.
Não aprecio, particularizando, os seus atos; avalio-lhe a inteligência e os dotes como homem. Tinha ânimo elevado, coração largo; nem sempre de inveja; nada de mesquinho na sua organização. Adorava a família; as nuvens políticas desfaziam-se, como ele dizia, assim que entrava no lar, onde era a afabilidade viva.
Estudou de mais o breviário de Rodrigo da Fonseca Magalhães. Tinha cegueira por aquele homem: foi o seu erro capital.
Recebeu ingratidões nefandas; nunca se vingou! Teve na vida torrentes de luz, durante mais de trinta anos, em que foi o arconte da política portuguesa; nenhuma sombra na morte, que o tomou nos braços, onde adormeceu sem contrações de agonia. Para os que o choraram – foram muitos e eu fui um deles – morreu cedo; para a posteridade e para a glória, morreu tarde. Já não tinha pulso com que pudesse dominar a corrente dos novos, que lhe haviam tomado as lições, que ele tivera do outro – do Raposa[1]. Começara a senti-lo amargamente, quando baqueou! E contudo, e apesar de tudo baqueou um grande homem!
Eu fiz-lhe um epitáfio, na época em que tratavam de levantar-lhe um monumento. É este:
Lutou, de aurora à noite, audaz sereno e forte;
E sorria, ao brandir a espada rutilante!
Ninguém teve mais luz no labutar constante;
Menos sombras ninguém, quando chegou a morte! “
Em resumo, para Bulhão Pato, o erro capital de Fontes Pereira de Melo, a quem reconhece enormes qualidades humanas e capacidades, teria sido a grande influência que sobre ele teria tido Rodrigo da Fonseca Magalhães.
Li há uns tempos o livro de Maria Filomena Mónica sobre Fontes Pereira de Melo, não me recordo de que tal influência tenha sido sequer abordada, pelo que tenho muitas dúvida sobre o juízo de Bulhão Pato.
Alguém me pode esclarecer?
[1] Assim era chamado Rodrigo da Fonseca Magalhães
Para além de ser o autor do post referido pelo major-general, engenheiro, Pedroso de Lima, relacionado com o tenente-general, engenheiro, Fontes Pereira de Melo, tenho estudado este militar e político por ter sido Fundador da Empresa da Revista Militar (1848) de que sou sócio efetivo desde 1993. Ao longo das leituras que tenho feito sobre Fontes Pereira de Melo nunca encontrei referências sobre Bulhão Pato.
A percepção que me ficou do “cruzamento” de obras e referências diversificadas sobre o general Fontes Pereira de Melo, nomeadamente no vasto acervo da Revista Militar, levam-me a considerar o juízo de Bulhão Pato adequado aquela relevante figura de militar, político e cidadão, que se pode considerar Oficial de Transmissões pela forma como se envolveu em projetos hoje considerados do âmbito desta Arma do Exército.
O post de general Pedroso de Lima é muito importante para a divulgação duma faceta interessante da personalidade de Fontes Pereira de Melo. Assim se faz História pelo que importa parabenizar o general Pedroso de Lima por mais esta inovadora contribuição para se estudarem os contextos em que se realizaram obras marcantes em Portugal.
Agradeço o comentário ao cor Pena, embora considere que quem deve ser primariamente parabenzado é Bulhão Pato em virtude do seu saboroso (como seria de esperar) texto e que constitui a parte fundamental do meu post.
Quanto a Bulhão Pato afirmar que o maior pecado de Fontes Pereira de Melo foi ter “uma cegueira por Rodrigo de Freitas Magalhães”, continuo a pensar (com os dados que tenho) que está enganado por duas razões fundamentais:
. Rodrigo de Freitas faleceu em 1858. A Regeneração, em que Freitas e Rodrigo estiveram juntos, iniciou-se em 1851, pelo que os dois estiveram em contacto político durante 7 anos. Ora a carreira política de Fontes Pereira de Melo durou até à sua morte em 1888. Fontes teve assim uma carreira política de 37 anos, apenas 7 dos quais podiam ter sido influenciados por Rodrigo da Fonseca.
. Consegui consultar o livro de Maria Filomena Mónica sobre Fontes Pereira de Melo. Confirmo não ter encontrado qualquer referência ao “seguidismo” de Fontes Pereira de Melo em relação a Rodrigo da Fonseca.