O “fullerphone” e o “power buzzer”, que permitia a telegrafia pelo solo (TPS), foram as duas novidades tecnológicas nas comunicações da 1ª GM. Todavia, enquanto o “power buzzer” rapidamente caiu em desuso, ultrapassado pela TSF, o “fullerphone” foi um sucesso, sendo sucessivamente melhorado, de tal forma que na 2ª GM ainda foi muito utilizado.

Confesso que antes de me debruçar sobre o material de transmissões usado pelo CEP, na 1ª GM, ouvia falar do “fullerphone” convencido que se tratava de um telefone. Na verdade, trata-se de um telégrafo cujos sinais são recebidos pelo operador sob a forma de sons, daí o sufixo “phone” no seu nome. A confusão aumenta ainda um pouco porque, como a corrente que o “fullerphone” mete na linha é contínua, é possível acoplar-lhe um telefone fazendo passar, nessa linha, em simultâneo, sem interferência, uma conversa telefónica e uma ligação telegráfica. Quase todos os modelos de “fullerphone” incorporavam um telefone, aproveitando esta característica. Para essa funcionalidade tinham um micro auscultador, igual ao dos telefones, que permitia a conversação telefónica e, para  os sinais telegráficos, tinham um auscultador, simples ou duplo, para os receber e uma chave de morse para os transmitir.

O telégrafo de Morse tinha sido inventado em meados do sec XIX, entrando de imediato ao serviço das comunicações militares e, por isso, era um meio disponível no início da 1ª GM. O telefone estava também disponível mas havia poucos equipamentos adaptados às duras condições das trincheiras. Os telefones existentes eram, essencialmente, de dois tipos, conforme o circuito de chamada: de magneto e de “buzzer” ou acústicos. Estes possuíam um vibrador (“buzzer”) para gerar um sinal alterno, de baixa frequência, que fazia actuar a campainha do telefone chamado ou fazia cair um alvo da central telefónica. Na frente, estes telefones eram muitas vezes utilizados para transmitir grafia, usando exclusivamente o seu circuito de chamada comandado ao ritmo dos sinais de morse.

As forças aliadas rapidamente se aperceberam que as comunicações estavam a ser escutadas pelo inimigo, provavelmente aproveitando o fenómeno de indução característico das correntes alternas. Foi esta constatação que levantou a necessidade de desenvolvimento de um equipamento telegráfico portátil, robusto, de corrente contínua, que pudesse ser utilizado na frente da batalha.

Deve-se ao engenho do Capitão ( mais tarde Major General) Algernon Clement Fuller a invenção do equipamento que satisfazia tais condições, com uma tecnologia completamente nova, que tentarei descrever em próximo artigo.

Na verdade, o equipamento desenvolvido pelo Cap Fuller revelou-se um sucesso. Era relativamente simples, com poucas componentes, o que permitia construí-lo numa caixa pequena e robusta. Era de fácil operação, com uma chave de morse para emitir e um auscultador para receber. Era extremamente sensível: 0,5 microampere na linha era suficiente para ouvir o sinal e 2 microamperes eram suficientes para uma escuta confortável ( isto em comparação com os 50 – 500 miliamperes necessários no telégrafo de Morse). Esta última característica permitia a utilização de linhas mais longas, de linhas de pior qualidade e, às vezes mesmo, permitia a comunicação com linhas cortadas, aproveitando a condutibilidade do solo entre as pontas da linha cortada.

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Foto de Fuller retirada do programa da BBC “The One Show” de 25/03/2015

Durante a 1ª GM foram utilizados vários tipos de “fullerphone”. O Ten Cor Soares Branco refere os seguintes modelos ao serviço do CEP[i]: PO, I, S, W, D3, F e Nº237

Existe uma publicação da “Arma de Engenharia – Serviço de Transmissões” com a descrição e funcionamento dos “fullerphones” existentes no Exército Português. Retirei dessa publicação a descrição dos vários modelos:

– PO (refere-se normalmente ao PO mark 235, existindo também o PO mark 237)

Foi construído pelo “Post Office”, daí a designação.   Está encerrado numa caixa de madeira, dividida em 2 compartimentos, ambos munidos de tampa com charneira. O compartimento superior contém a chave de morse ou transmissor e restantes botões de comando, bornes de ligação à linha e o vibrador. O compartimento inferior, bipartido, contém, num dos lados, os restantes componentes do circuito eléctrico e, no outro, as pilhas. A caixa tem as dimensões de 25x25x23 cm e pesa 7 kg.

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Exemplar do Fullerphone  PO 235 existente no museu das transmissões

– I

Posui um potenciómetro ajustável para anular o efeito das correntes parasitas, melhorando a recepção. As dimensões são: 25,5x27x18,5 cm, e o seu peso 6,9 Kg;

– S

Está encerrado numa caixa de madeira, possuindo uma correia para o transporte a tiracolo. As suas dimensões são: 27,5×13,5×20,3 cm, e o seu peso 4,6 Kg;

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Fullerphone Trench S (fonte: Imperial War Museum)

– W

Semelhante ao modelo S. As suas dimensões são: 25×13,5×20,5 cm e o peso 3,7Kg;

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Fullerphone Trench W (Modelo existente no Museu das Transmissões)

– D3 (ou D. mark III)

É constituído por uma caixa de ebonite encerrado numa bolsa de couro, tendo a pilha noutra bolsa de couro, cosida à primeira. A caixa de ebonite tem dois compartimentos, um mais alto que o outro, com o fundo metálico, para ligação directa à terra. Sobre a tampa do compartimento mais baixo e mais largo, estão montados a chave de morse, outros comutadores e os bornes . As suas dimensões são: 17x25x24 cm, e o seu peso 4 Kg;

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Fullerphone Trench D (fonte: Imperial War Museum)

– F

È semelhante ao D. mark III, mas encerrado numa caixa de madeira;

– Nº 237

Deve tratar-se do modelo PO mark 237 . Penso que seja semelhante ao PO mark 235. Não encontrei dados a ele referentes.

Os modelos D, F, S e W são designados “de trincheira”, enquanto os modelos PO eram considerados de gabinete.

No final da guerra foi construído o “fullerphone Mark III” ( não confundir com o “D. mark III”, anterior) que foi o modelo de maior longevidade. Foi utilizado até cerca de 1937, ano do aparecimento do “Mark IV”, utilizado durante a 2ª GM. Posteriormente apareceram ainda os modelos “Mark V” e “Mark VI”.

[i] A Batalha de “La Lys” e as transmissões, Revista de Artilharia .

1 comentário em “Equipamentos de transmissões da 1ª GM – O “Fullerphone”

  1. Sou possuidor de um Fullerfone de modelo não identificado, construído em data desconhecida pelas Oficinas Gerais de Material de Engenharia em Belém, Lisboa, que me foi oferecido pelo meu filho Tito Eugénio, em 5 de Novembro de 2026, à minha chegada a Portugal, vindo em férias da Universidade Presbiteriana Mackenzie, em São Paulo, Brasil.
    António Amândio Sanches de Magalhães (Ten. Milº Artª nº 600/61, reformado, oficial de Transmissões do RAP 2 de 1962 a 1963, c/ curso de Analista de Tráfego (Informação) da CHERET, Estado Maior do Exército em 1963 e chefe da Equipa de Compilação e Controle das Operações do DLRT 7, do CTI de Cabo Verde de 1963 a 1965.

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