Cap. IV – Missão em Macau

As minhas missões em Macau, começaram quando me encontrava colocado na DAT, prolongaram-se durante o tempo em que fui 2.º Comandante do RTm e terminaram com a minha nomeação para comandante desta Unidade. A duração de cada estadia variou entre um e cinco meses, sendo a última a mais extensa de todas. Macau foi para mim um frutuoso estágio para o SITEP, que foi, por assim dizer, o projecto da minha vida.

1. Ida a Macau

Estava eu colocado na Direcção da Arma de Transmissões, depois de terminadas as minhas funções na Divisão de Comunicações e Electrónica do EMGFA, quando na DAT surgiu um rumor de que seria preciso um engenheiro com experiência em Macau. Constava ainda que o trabalho tinha que ver com um sistema Radiotelefónico para o qual não haveria nas Forças de Macau, ninguém preparado para o fiscalizar e aceitar.

O Director da DAT consultou outro antes de mim, mas não acertou com ele. Quando chegou a minha vez, pedi para ser informado, através do Gabinete de Macau em Lisboa, ficando a saber que o sistema radiotelefónico se destinava às Forças e que o pedido era do Governador, Comandante Almeida e Costa.

Segui para Macau com um mínimo de informação disponível. Quando esperava que o aeroporto fosse em Honk Kong e que aí alguém me esperasse, afinal o aeroporto era em Kow Lun, devendo daí arranjar transporte para Hong Kong e daqui para Macau. Havia vários chineses oferecendo transporte para Hong Kong e aceitei o serviço de um deles, uma vez que, se alguém me tinha vindo esperar, ou não pôde chegar a tempo ou não me reconheceu.

Para meu espanto, o meu transportador chinês levou-me para bordo de um pequeno “san pan” e meteu-se às ondas. Mala a meu lado, um olho no chinês, lá me foi parecendo que ele rumava para o sítio certo, com a cidade de Hong Kong surgindo à nossa esquerda.

Não levava moeda local e foi preciso entregar-lhe uma nota que ultrapassava em muito o que tinha de pagar. Chegado ao destino, foi preciso que me deixasse com a mala e fosse à procura de um banco para trocar a nota por moeda local e me viesse entregar o troco. Por estranho que possa parecer a um ocidental, o chinês voltou com o troco, depois de se ter pago apenas do que lhe era devido. Estávamos nós a acertar contas por gestos, próximo do terminal do jet foil para Macau (o chinês sabia apenas algumas palavras em inglês), quando fui abeirado por um sujeito que suspeitou que eu fosse quem ele procurava. Apresentou-se como Comandante Monteiro, e disse ser o encarregado de me encontrar e levar a Macau. A partir dali a iniciativa ficou por conta dele.

2. Primeiro Projecto em Macau

Chegado a Macau deparei-me com um sistema de radiocomunicações para o CFSM, PSP, PMF e Bombeiros, em incipiente estado de instalação. O sistema estava a ser assistido pelo Cap. Ten Monteiro, oficial que, além de não ter habilitação específica sobre o assunto, não tinha participado na produção de Caderno de Encargos, que não existia. O sistema tinha sido adquirido pelo Conselho Administrativo através de trocas de notas de comprometimento.

Perante o facto, aconselhei o Comandante das Forças de Segurança de Macau que chamasse o empreiteiro para assinar um contrato que também não existia. Autorizado pelo Comando produzi uma peça que repunha em documento oficial todos os requisitos contratuais que defendiam a Fazenda e instituía normas de relacionamento entre o dono da obra e o empreiteiro. O contrato foi assinado, em representação do Governo de Macau pelo Secretário da Segurança, Cor. Inf. Manuel Maria Amaral de Freitas e, em representação da firma “Infa Corporation Limited”, pelo seu sócio-gerente Peter Cheung Tsang, em 2/4/1982.

O Contrato, no montante de 6.068.286HK dólares foi assinado pelas partes e, como o sistema estava já em instalação, pouco depois procedeu-se à recepção provisória, na qual foi possível recuperar 349.506,10HK dólares, resultantes do benefício que o empreiteiro obteve por receber 60% do montante do contrato, referente ao material dado como recebido provisoriamente.

Refiro que o sistema nunca ficou completamente a contento porque não tinha sido pensado em termos de futuro, de que resultou o emprego de material que ao tempo já estava tecnologicamente ultrapassado. Isso está na base do Projecto n.º cinco, referido no fim destas memórias.

Apesar disso, o resultado obtido foi tão a contento do Comando e tão badalado que, a partir dali, fui responsabilizado por outros projectos e chamado para dar pareceres sobre vários trabalhos, alguns dos quais fora do âmbito do próprio CFSM, como das Obras Públicas, p.e.

Os equipamentos do presente projecto abrangiam os seguintes locais e comandos:

Estação repetidora da Guia;

CFSM (Comando das Forças de Segurança de Macau);

PSP (Polícia de Segurança pública);

PMF (Polícia Marítima e Fiscal);

Bombeiros;

Estações Base:

PMF – 8

PSP – 9

Bombeiros – 2

O Material era constituído por uma estação repetidora, consolas nos comandos, móveis na Brigada de Trânsito da PSP, Vedetas da PMF, viaturas de comando das várias Forças e 620 E/R portáteis.

3. Segundo Projecto nas FSM – Polícia Judiciária

O segundo trabalho que executei em Macau foi a “Empreitada para o fornecimento e instalação do Sistema de Comunicações da Polícia Judiciária de Macau e da construção das Infra-estruturas de Apoio necessárias”.

Este trabalho englobou as fases de projecto, concurso público, apreciação das propostas, proposta de adjudicação, fiscalização e recepção.

As infra-estruturas deste sistema distribuíam-se pelo comando da Polícia Judiciária, pelos Comando das Forças de Segurança (CFSM), pelo morro da Guia, onde se situava o repetidor, e por Coloane Alto onde se situava um receptor para captar as estações móveis e os portáteis, cujo sinal não atingia a Guia ou a atingia em condições muito fracas. Para decidir quando dois sinais eram recebidos, qual deles, em cada momento, era o melhor para assegurar a comunicação, foi montado um equipamento (voter) que seleccionava o melhor de ambos,

O sistema de comunicações da PJ destinava-se a permitir:

(1) – Dispor de três equipas independentes no terreno, cada uma com a sua estação directora (Estação Móvel) e com os seus portáteis, de 1 a 4, agrupados sob o seu comando. Cada Estação Móvel podia trabalhar em coordenação com as restantes bem como com as consolas de base da CFSM e da PJ em canal próprio.
As Estações Móveis eram todas iguais em todas as viaturas. Nos canais 2 e 5 trabalhavam como PDR (Posto Director) com todos ou parte dos seus portáteis. Nos canais 6 a 8 assumem-se como portáteis para falar com os restantes.
Qualquer Estação Móvel pode trabalhar como PDR das restantes, nos canais 1 e 3.

(2) – Dispor de equipamentos VIP, equipamentos pessoais, destinados ao Comando da PJ. Constituídos por três equipamentos A,B,C, dos quais A pode comunicar com B ou C separadamente em privado, sem que o excluído possa intervir.

(3) – Dispor de equipamentos Portáteis, constantes de um naipe (extensível) de 12 equipamentos, destinados a formar as redes dos agentes.

(4) – Dispor de três consolas. Duas Consolas Principais, ou Stand Alone Consolas, das quais, uma no CFSM e outra no centro de operações da PJ. A terceira consola é uma consola remota destinada ao comando remoto do Comando da PJ.

Consolas

As consolas principais foram ligadas entre si por pares de linhas alugadas à CTM (Companhia de Telecomunicações de Macau), enquanto não foi executado o projecto de Rede de Cabos Enterrados em Tubagens, projecto que interligou por cabo todos os comandos e órgãos subordinados do CFSM. A consola da PJ tem comando do serviço sobre a do CFSM.

As consolas principais são geridas segundo os seguintes princípios:

(a)   Funcionam em paralelo ou em alternativa uma da outra, isto é, em simultâneo ou uma da cada vez.

(b)   Prioridade à Consola da PJ. Mesmo quando só a consola do CFSM estiver em funcionamento é possível à consola da PJ entrar em funcionamento sobrepondo-se àquela. Terminada a intervenção da consola da PJ o sistema regressa automaticamente à posição anterior (Take over command).

(c)   Intercomunicação. Ambas as consolas Principais têm possibilidade de comunicar à voz uma coma a outra.

(d)   Acessibilidades. Tanto a consola do CFSM como a da PJ podem fazer Cross Patch entre o sistema de UHF (da PJ) e VHF (da PSP) e receber chamadas das redes telefónicas das FSM e da CTM.

Sistema de feixes

O sistema de telecomunicações da PJ funciona em UHF, na banda dos 450 aos 462MHz, actuando dentro desta banda os Móveis, os Portáteis, os Repetidores da Guia e o Receptor/Retransmissor de Coloane Alto. Trabalha também nesta banda o Emissor/Receptor do CFSM, que faz a ligação com a Guia. O sistema de telessinalização de avarias trabalha em 171.050 MHz.

O sistema funciona da seguinte maneira: as Estações Móveis podem formar redes que não precisam de repetição de cobertura territorial. Esta situação também se repete com os VIP, mas tanto aos Portáteis como as Estações como os VIP dispõe de canais de cobertura. Quando trabalham num canal destes dá-se o seguinte: suponhamos que um destes equipamentos inicia uma chamada e esta é recebida tanto por Coloane Alto como pela Guia. Coloane Alto retransmite o sinal para a Guia que o envia, juntamente com o que ela própria recebe à consola do CFSM. Antes de atingir a consola os sinais passam ambos pelo Voter que decide qual deles é enviado à consola. A resposta da consola é enviada ao site o Emissor/Receptor do CFSM da Guia, que o repete. O sinal repetido pela Guia cobre o território e atinge também os elementos da rede a que o iniciador da conversa pertence. A resposta obtida segue os mesmos trâmites que a conversa inicial.

Trabalhos de Engenharia

Incluídos no projecto contavam-se os trabalhos de construção e adaptação dos locais de apoio, nomeadamente:

(1)   – Na Polícia Judiciária;

(2)   – CFSM;

(3)   – Guia;

(4)   – Coloane Alto;

(5)   – Coloane Vila.

Na Judiciária preparou-se o fornecimento de energia, com a colocação de quadro eléctrico, carregador de baterias, banco de baterias, repartidor de cabos, recepção dos pares telefónicos alugados, colocação da consola principale remota, local para o futuro PABX.

No CFSM foram executados os trabalhos para acomodação e fornecimento de energia para os futuros equipamentos de transmissões, câmara de visita permanente para recepção dos cabos do futuro projecto e do Gate Way (RLU= Remote line unit) para a CTM (Pares da rede civil).

Na Guia igualmente foi preciso criar espaço para a instalação do repetidor com fornecimento de energia.

Em Coloane Alto foi preciso construir um edifício de raiz, colocar uma torre auto-suportada de 18m, vedar o recinto, colocar terras de serviço e anel de equilíbrio estático, montar a energia solar para funcionamento normal e energia de recurso para 96 horas de serviço contínuo. O edifício foi construído com vista à expansão futura (Projecto Troncas) e com robustez bastante para suportar um reflector passivo de 3x4m para ventos de 180km/h para o sistema telefónico de cobertura.

Telessinalização de avarias

O sistema foi montado com um apertado sistema da telessinalização de avarias que reporta uma dúzia de anomalias do sistema desde a sinalização das antenas, até temperatura das baterias, integridade das vedações, etc.

4. Terceiro Projecto nas FSM – Rede Telefónica das FSM

“Empreitada para o fornecimento e instalação da Rede Telefónica das Forças de Segurança de Macau e construção das Infra-estruturas de Apoio necessárias”

Foi por mim elaborado um Caderno de Encargos contendo todos os passos das Condições Gerais do Concurso, Condições Jurídicas e Administrativas, Condições Técnicas Gerais e Condições Técnicas Especiais. Este trabalho de elaboração do Caderno de Encargos tão detalhado, tal como a da Rede Radiotelefónica da PJ, deveu-se a não haver uma doutrina de disciplina das aquisições e a colmatar a falta de domínio do português nos empreiteiros locais. Um caderno de encargos extensivamente detalhado permitia aos concorrentes, depois de traduzido para inglês, encontrarem lá tudo o que pretendiam, sem necessidade de andarem sempre a fazer perguntas, cujas respostas não havia a certeza que entendessem.

Basicamente o Concurso consistiu em construir redes telefónicas internas no QG/CFSM, PSP, PMF e Marinha, Bombeiros e na Polícia Judiciária. Cada uma destas redes foi dotada com um PABX (PPCA), com capacidade para 100 extensões (expansível) e 48 troncas da rede pública. Todos os PPCAs ficaram ligados entre si e ao PABX de CFSM, que funcionava como Tandem, por linhas alugadas à rede pública, permitindo uma rede privativa das FSM, com numeração própria. A estas unidades associou-se o palácio do Governo, que já tinha rede interna. Tal rede contou com o desenvolvimento tecnológico introduzido na rede pública pela da CTM (Companhia de Telecomunicações de Macau), com vista à introdução de soluções de interface e de serviço compatíveis e menciona já uma rede de cabos privativa do FSM, situação que veio a evoluir para ser a própria CTM a montar. Trata-se da rede de cabos privativa em conduta cedida pela CTM, que a própria companhia instalou, conforme consta de outro projecto.

Para não tornar demasiada pesada a descrição do trabalho transcreve-se uma parte das Condições Técnicas Especiais do Caderno de Encargos, supondo-se deixar uma ideia aproximada do que foi feito.

Locais e unidades a Ligar

A. Unidades e serviços das FS

a)  – QG/CFSM

O QG/CFSM encontra-se sediado no Quartel de São Francisco e requer uma rede telefónica interna, construída de raiz, um PABX que sirva a rede telefónica e de tandem para os restantes PABX das Forças. Deve ainda dispor de troncas à rede pública e dar acesso à rede da PJ e do Governo;

b) – Comando da Polícia de Segurança Pública (PSP)

O Comando da PSP encontra-se no Quartel da Flora e necessita de rede telefónica interna e de um PABX que assegurará as ligações internas e o acesso à tandem ao QG/CFSM por troncas, à rede pública e ainda às suas subunidades:

      Esquadra 1, na Calçada do Gamboa;

Esquadra 2, na Av. Almirante Lacerda;

Unidade Táctica de Intervenção da Polícia (UTIP), às Portas do Cerco;

Formação do Comando, no Ramal dos Louros;

Centro de Recuperação Social, na Ilha da Taipa;

Esquadra da Taipa;

Esquadra de Coloane.

Centro de Instrução Conjunta (CIC), em Coloane

Estima-se que o comando desta força (PSP), a médio prazo, será transferido para as novas instalações, sitas na área do Porto exterior.

c)  Corpo de Bombeiros (CB)

O comando do Corpo de Bombeiros situa-se na Estrada do Repouso e necessita de uma rede interna e de um PABX que assegure as ligações telefónicas internas e tenha acesso ao tandem para ligação às outras forças e acesso por troncas à rede pública.

d) – Comando da polícia Marítima e Fiscal (PMF)

O Comando da PMF encontra-se instalado no Quartel dos Mouros, na Caçada da Barra e precisa de uma rede telefónica interna servida por um PABX, que também assegure acesso ao tandem do QG/CFSM para interligação às restantes forças e troncas à rede pública. Além disso encontram-se juntamente instalados no mesmo edifício os Serviços de Marinha, que partilham as instalações telefónicas. Os serviços destes dois corpos desenvolvem-se maioritariamente na Doca de D. Carlos, pelo que é preciso assegurar uma rede que se estenda aos dois locais

e) – Centro de Instrução conjunta (CIC)

O CIC encontra-se instalado na Quartel do mesmo nome na Ilha de Coloane, e precisa de uma rede interna, um PABX com uma ligação por feixe hertziano entre essa central e a tandem do QG/CFSM. Além disso requer acesso à rede pública.

f) – Interligação às consolas dos sistemas de UHF/VHF

O Sistema radiotelefónico da PJ é operado na sua sede ou no QG/CFSM, utilizando linhas alugadas à CTM. Com a existência do Sistema Telefónico Privativo das FS, essas linhas serão transferidas para os cabos das FS. O sistema agora instalado deve poder receber chamadas Radiotelefónicas encaminhadas através das consolas.

B. Outras entidades

     a) – Governo

O palácio do Governo dispõe de um PPCA privativo, ligado à rede pública, e outras facilidades. Pretende-se a sua interligação, no futuro, à rede privativa das FSM/Governo/Polícia Judiciária.

       b) – Polícia Judiciária

A Polícia Judiciária encontra-se sediada na Rua Central e dispõe de uma central telefónica em razoável estado de conservação. Pretende-se que, quer seja substituída esta central nesta fase ou não, a PJ fique ligada à rede privativa das FS.

       c) – Entidades com cargos predominantes na governação.

As entidades que desempenham funções vitais para o Governo necessitam, por razões de Estado, de dispor de meios de comunicação que lhe permitam a troca de informação confidencial, quer às horas e nos locais onde normalmente exercem as suas funções, quer nas suas residências. Tem-se essa necessidade em consideração e apresentam-se soluções para englobar na rede privativa as residências de entidades especiais.

C. Algumas características técnicas

Não entro aqui nas especificações técnicas totais o que encheria algumas páginas (o Caderno de Encargos tem mais de 60 páginas e 15 figuras). Porém, destaco algumas porque elas já revelam que no meu subconsciente latejava o SITEP:

      a)    – O sistema terá possibilidade de tratar discriminadamente os seus utilizadores, ampliando, mantendo ou reduzindo as facilidades atribuídas por software a cada um, de modo a proporcioná-las às necessidades da função desempenhada.

      b)    – Deseja-se que a rede possa evoluir para rede integrada de dados e voz.

      c)    – Prefere-se que integre quando possível os meios existentes, nomeadamente os telefones de disco.

      d)    – Pretende-se que seja compatível e interoperável com a rede pública da CTM.

      e)    – Pretende-se que cada utilizador não necessite mais do que um telefone para executar todos os tipos de chamadas (Rede Interna, CTM e Internacional).      

Considerações finais

Este projecto foi por mim conduzido em todas as suas fases e entrou em funcionamento pleno depois do projecto de Rede de Cabos executado pela CTM. De facto, a partir desse momento o CFSM e o Governo passaram a dispor de um Sistema Privativo de redes, centrais e cabos que lhe permitia trocar informação de forma segura, sem passar pala rede pública.

5. Quarto Projecto nas FSM – Rede de Cabos

O quarto trabalho que levei a cabo em Macau foi adjudicado à Companhia de Telecomunicações de Macau (CTM), dado que ele se inseria nas suas próprias estruturas.

Tendo já sido executadas e postas em funcionamentos as redes telefónicas internas das FSM (Comando, PSP, PMF, PJ e Bombeiros), havia necessidade de as interligar, o que só precariamente era conseguido, dado que os CTT funcionavam de forma pouco eficiente e com tecnologias muito gastas.

Porém, por esta data (1982/1983) fundou-se a Companhia de Telecomunicações de Macau (CTM), que partiu para remodelação total da sua rede e para o emprego de tecnologias mais avançadas. Por conhecimento com o Director Paulo Alves, encetei negociações informais com vista à possibilidade de as Forças de Segurança estruturarem as suas comunicações numa rede de cabos que as interligassem e num conjunto de troncas de acesso das centrais telefónicas das Forças à rede pública. Isto possibilitaria a cada utilizador das FSM a ter acesso a toda a rede das Forças, sem passar pela rede pública e ainda ter acesso separado à rede pública local, e à rede pública internacional, passando para as FSM a limitação destes acessos. Dado conhecimento ao Comando e explicadas as vantagens de tal projecto, este não só apoiou a ideia como a incentivou.

As negociações prosseguiram sempre com aceitação favorável da CTM, o que me levou a fazer um projecto que englobasse:

– A aquisição de uma conduta enterrada da rede da CTM, servindo todas as unidades e órgãos das FSM e do Governo, na extensão de 7.590 metros;

– A aquisição de um cabo de 100 pares, da mesma extensão, preparado para veicular, sem repetidores, informação PCM até 2048 kbits, incluindo o seu lançamento, ensaio, pressurização e entrega às FSM;

– Pressurização da rede de cabos assim formada;

– Aquisição de um número de troncas para ligar os PPCAs (PABX) à rede pública no CFSM e em cada subunidade.

– Acrescentar outras necessidades como ligar ao Governo, à área residencial, à Marinha (Doca de D. Carlos), à Guia e ao futuro Comando da PSP.

Com a finalidade de abreviar e dar uma ideia resumida do projecto passo a transcrever algumas das 21 Cláusulas do Contrato que acabou por se estabelecer entre o CFSM e a CTM, respectivamente como primeiro e como segundo outorgantes. Salto as Cláusulas que não são essenciais como a que estabelece a minha presença na qualidade de autor do projecto.

Passo à transcrição:

“EMPREITADA PARA O FORNECIMENTO, INSTALAÇÃO E ENSAIO DOS MEIOS DE INTERLIGAÇÃO DA REDE DE COMUNICAÇÕES TELEFÓNICAS DAS FORÇAS DE SEGURANÇA DE MACAU, DAS TRONCAS DE ACESSO À REDE PÚBLICA E SINALIZAÇÃO DE ACESSO DE MARCAÇÃO. (28/5/84)

……………………………………………………………………………………………….

CLAÚSULA PRIMEIRA – (Tubagem): – O segundo outorgante obriga-se a ceder, a título perpétuo, a utilização de uma conduta da sua rede subterrânea de comunicações, para nele ser instalado um cabo de comunicações, propriedade do Comando das Forças de Segurança de Macau (CFSM), destinado ao uso que este comando entenda dar-lhe.

A conduta acima referida desenvolver-se-á segundo os percursos da rede da CTM, já existentes ou a concluir, na extensão de sete mil quinhentos e noventa metros, terá 10cm de diâmetro e ligará entre si os seguintes comandos e locais:

Do Comando das Forças de Segurança de Macau, sito no Quartel de São Francisco, para:

a) – Polícia de Segurança Pública, abreviadamente PSP, sita no Quartel da Flora, através da rua Nova à Guia/Estrada da Vitória;

b) – Sala de Repartidores do edifício da Guia, sita no Forte da Guia, através da Caçada do Paiol e, posteriormente, pela encosta da Guia entrando no forte pelo lado sudoeste;

c) – Comando do Corpo de Bombeiros, abreviadamente Bombeiros, sito na Rua Coelho da Amaral pela Rua Sacadura Cabral e Av. Sidónio Pais entre a PSP e os Bombeiros e segundo o percurso já descrito entre o CFSM e a PSP;

d) – Directoria da Polícia Judiciária, abreviadamente PJ, sita na Rua Central pelas Ruas da Praia Grande e Av. Almeida Ribeiro;

e) – Palácio do Governo de Macau, abreviadamente Palácio, sito na Rua da Praia Grande pelas ruas Central, S. Lourenço e Travessa do Paiva entre a PJ e o Palácio e segundo o percurso já descrito entre o CFSM e a PJ;

f) – Palácio e residência de S. Excelência o Governador e Comandante das Forças de Segurança de Macau, sitos respectivamente no Palácio de Santa Sancha e na Vivenda de Estrada de Santa Sancha, pelas Ruas da Penha, Boa Vista e Comendador Kou Ho Neng entre o cruzamento da Rua da Penha e Estrada de Santa Sancha e segundo o percurso já descrito entre aquele cruzamento e o CFSM;

g) – Comando da Polícia Marítima e Fiscal, abreviadamente PMF, sito na Caçada da Barra, pela Rua Padre António e entre aquele cruzamento e o CFSM, pelo percurso já descrito;

h) – Serviços de Marinha, sitos na Doca de D. Carlos, pela Rua da Barra e Caçada da Barra entre a PMF e a Doca de D. Carlos e pelo percurso já descrito entre a PMF e o CFSM.

CLASULA SEGUNDA- (Cabos): 1. O segundo outorgante obriga-se a fornecer a instalar no interior da conduta descrita na cláusula anterior, ligar nas juntas, ligar proteger e identificar nos repartidores e caixas terminais e pressurizar, uma rede de cabos de capacidade uniforme de cem pares de secção dos condutores de zero virgula nove milímetros quadrados, próprio para transmissão em PCM , sem necessidade de repetidores até à velocidade de transmissão de dois mil e quarenta e oito quilo bits por segundo, segundo o diagrama de encaminhamento e continuidade contido no anexo ao ofício n.º 2538 de 21 de Maio de 1984 do CFSM, documento considerado parte integrante deste contrato e se dá aqui por reproduzido, traduzindo a versão final e definitiva e anulando todas as anteriormente apresentadas;

Os Parágrafos 2, 3, 4, 5 e 6 não se transcrevem.

CLAUSULA TERCEIRA- (Tubagens para as entradas de Cabos):- O segundo outorgante obriga-se ainda a prover todos os ramais, que conduzem da sua rede de comunicações, até à parede exterior dos edifícios onde se encontram os repartidores e caixas de distribuição privativas com o número de tubos necessário e de diâmetro adequado para receberem folgadamente a quantidade de cabos descrita no paragrafo oito do ofício número 4626 de 12 de Dezembro de 1983, do CFSM, com exclusão dos troços do Bom Jesus e Hoover Court, documento considerado como parte integrante deste contrato e aqui se dá por reproduzido.

CLAUSULA QUARTA – (Acesso à rede pública – RLUS):- O segundo outorgante obriga-se a executar o trabalho de modo que os pares de linhas destinados a assegurar o acesso da Rede de Comunicações das FSM à rede pública (RLUS) quando incluídos em cabos gerais de distribuição não sejam acessíveis à intercepção por pessoas não autorizadas, ao longo do percurso entre os MDFs ( Repartidores e concentradores) e os RLUS e beneficiem de protecção física e visual em áreas públicas nas proximidades das entradas dos vários comandos que impeçam a sua referenciação.

CLAÚSULA QUINTA- (Número de linhas de acesso à rede pública):- O segundo outorgante obriga-se a garantir, até 30 de Maio de 1984, dezasseis troncas de acesso à rede pública no QG/CFSM e outras dezasseis na PSP e as restantes quarenta a curto prazo, com a distribuição descrita no parágrafo quarto de ofício 4626 de 12 de Novembro de 1983, do CFSM, que aqui se dá por reproduzido e fazendo parte integrante do presente contrato.

CLAÚSULA SEXTA- (Requisitos de acesso, por marcação à rede pública):- O segundo outorgante compromete-se e a garantir as seguintes características para as troncas referidas na cláusula quinta: 1. Ser possível, a partir de extensões da rede das FSM e das operadoras das consolas ter acesso a:

– Rede pública de Macau por marcação do zero (0);

– Rede pública de Hong Kong, por marcação do código zero, seguido de um (01), como segundo e terceiro dígitos;

– Rede pública internacional, por marcação do código zero, seguido de zero (00), como segundo e terceiro dígitos;

2. Aceitar para chamadas de saída de cada um dos PABXs das FSM, indistintamente qualquer das seguintes sinalizações de marcação: “Dual Pulse Signaling” ou “Dual Tone Multy Frequency Signaling”;

3. Garantir troncas de dois sentidos de tráfego para todos os PABXs, agrupadas em dois grupos iguais, A e B, sendo atribuído ao grupo A um número piloto com “ Hunting Facility” e ao grupo B um “Individual Number”, a cada tronca.

4. O Grupo A, a que se refere o parágrafo anterior, que ligará o PABX da PSP, deverá ser subdividido, reservando-se duas das suas oito troncas para encaminhar chamadas de socorro do serviço público cuja formação será nove, nove, nove (999).

5. Garantir o fornecimento de sinais longitudinais de 50Hz, 55V e duração de 100msON e 150msOFF que permitam a rede privativa fazer a fiscalização das chamadas de saída para Hong Kong e para a rede Internacional.

CLÁUSULA SÉTIMA- (Pressurizador de Cabos):- O segundo outorgante obriga-se a fornecer, montar, ensaiar e regular no CFSM, uma unidade de pressurização de cabos, de fabrico CENTREL, modelo 5510, de capacidade de pressurização até cinco cabos, bem como todos os seus comandos e acessórios, tubagens, válvulas e sensores, garantido a completa pressurização de toda a rede de cabos descrita na cláusula segunda.

As Claúsulas Oitava até à Décima Sétima não se transcrevem.

CLÁUSULA DÉCIMA OITAVA- (Pagamentos):- O primeiro outorgante pagará ao segundo outorgante pelos trabalhos e fornecimentos objecto do presente contrato a importância total de MOP $ 654.386,60 ( seiscentos e cinquenta e quatro mil, trezentas e oitenta e seis patacas e sessenta avos).”

Considerações finais

Deixo por fora várias cláusulas que não acrescentariam informação para o fim em vista.

Numa extensão ao contrato, adjudicou-se ainda à CTM o fornecimento, instalação e guarnição com blocos terminais de 10 Repartidores (Main Distribution Frames), de 400 pares, devidamente ligados, ensaiados e protegidos, nos seguintes locais:

Doca de D. Carlos;

Sala de equipamentos de VHF da Guia;

CFSM,

PSP;

PMF;

PJ;

Bombeiros;

CIC /ESFSM (CIC = Comando de Instrução Conjunta);

Jardim da Residência do CMDT das FSM (Zona Residencial)

Palácio do Governo

Estes repartidores, assim guarnecidos, continham as troncas da rede pública e as da rede interna das FSM.

O contrato concluiu-se durante o ano de 1984, garantindo em Macau, um sistema de comunicações, próprio das Forças, independente da rede pública, mas com acessos claros e cómodos à rede Publica. Acrescento que o próprio Governo beneficiou desta integração e passou a poder funcionar com todas as suas Forças, mesmo com quebra da rede pública

Juntam-se dois dos anexos referidos no contrato:

Fig37 - Diagrama da Rede de Cabos (clique para aumentar)
Fig37 – Diagrama da Rede de Cabos (clique para aumentar)

A fig mostra a rede de cabos, as juntas, PABXs, repartidores nos vários comandos e os RLU (que fornecem as troncas e os acessos à rede pública).

Fig38 - Diagrama de Juntas, Repartidores e RLU (clique para aumentar)
Fig38 – Diagrama de Juntas, Repartidores e RLU (clique para aumentar)

A fig mostra não só esses elementos como revela como correm os pares dentro dos cabos e como se distribuem nas emendas (Juntas).

6. Quinto Projecto do CFSM – Projecto Troncas

Este projecto foi realizado por mim já depois de ter comandado o RTm/STM. Depois regressei deixando em Macau o Cap. Eng. Tm Porfírio, entretanto aí colocado como oficial de Transmissões. Uma indisponibilidade minha levou a que as fases seguintes do Projecto fossem executadas pelo Cap. Porfírio.

Já se verificou (Primeiro Projecto) que o sistema radiotelefónico de VHF de cobertura do território (PSP e PMF) se revelou deficiente desde a sua montagem, por não se ter atendido aos requisitos que a tecnologia já podia satisfazer e que já se mostravam essenciais para o CFSM. Era pois necessário colmatar esta deficiência. Porém, como não havia doutrina no território nesta área, resolvi especificar um sistema de troncas (o mais avançado na altura) em todas as suas vertentes, não poupando esforços para deixar claro e em pormenor o que se pretendia.

A finalidade de produzir um projecto com este detalhe (mais de 200 páginas de texto e 45 desenhos) foi obrigar os fornecedores a uma disciplina firme e a limitar a necessidade de grande número de perguntas numa situação em que os fornecedores mal entendiam o português. Foi também facilitar o acompanhamento das obras por um oficial residente, uma vez que o autor do projecto só permanecia no território de forma intermitente. Foi ainda para estabelecer uma doutrina de liderança, que não havia, com projectos complexos como o Projecto Troncas.

O Projecto Troncas consiste num sistema de radiocomunicações, usando a filosofia de Troncas, suportado num feixe de microondas para suporte da comunicação e interligação entre as estações repetidoras e das infra-estruturas de apoio necessárias (edifícios, torres, terras, energia). As estações repetidoras situam-se na Guia, na Taipa e em Coloane Alto.

A filosofia de Troncas consiste em colocar todos os canais disponíveis à disposição de todos os utilizadores e prover o sistema com dispositivos que permitam disponibilizar um canal da “pool” (fundo comum) por cada chamada, canal que, terminada a chamada, regressa à “pool”.

a. Conceito de sistema de troncas básico.

Um sistema de troncas básico assenta numa única estação repetidora contendo:

– Um grupo de canais de RF para emissão e outro para recepção, com um repetidor por canal;

– Um canal de controlo dedicado, através do qual se dialoga com o controlador central do sistema de troncas;

– Um controlador central do sistema de troncas, o qual providencia inteligência para gerir todas as funções do sistema;

– As estações controladas por processadores, os radio-móveis e os portáteis.

b. Sistema de Troncas montado em Macau

Para cobertura do território de Macau, cidade e ilhas, não foi suficiente um sistema de troncas básico, tendo sido necessários três, assim distribuídos:

– Um em Macau (Guia), onde ficou o “Master Site Trunking Controler” (Estação directora – Master), com 20T/20R;

– Um na Taipa, onde ficou o “Local Site Trunking Controler 1”, (Estação dirigida 1 – Slave), com 20T/20R;

– Um em Coloane Alto, onde ficou o “Local Site Trunking Controler 2”, (Estação dirigida 2 – Slave), com 20T/20R. (T= transmissor; R= Receptor).

Para integrar num projecto só os três sites tem, como se disse, que se recorrer a um sistema de microondas que suporte a transmissão entre sites e assegure a gestão do sistema de troncas. Para ligar os três sistemas de troncas básicos é necessário ainda, que um dos sistemas básicos trabalhe como Master (Mestre), e que os restantes trabalhem como Slaves (Escravos).

c. Memória descritiva do projecto troncas

Para o projecto Troncas foi necessário:

1 – Construir um edifício na Taipa Grande, reconverter os edifícios terminais da Guia, de Coloane Alto e alterar as instalações do Comando, das Corporações e das subunidades destas;

2 – Fornecer e instalar em cada um dos locais (Guia, Taipa e Coloane Alto) uma torre auto-suportada para apoio das microondas e das antenas das Estações Repetidoras;

3 – Fornecer energia de recurso na Taipa e em Coloane Alto e adaptar a da Guia;

4 – Fornecer e instalar o sistema de microondas para ligar a Guia, a Taipa, Coloane Alto e Coloane Vila, onde funciona a Escola Superior da Forças de Segurança de Macau (ESFSM);

5 – Fornecer e instalar um sistema de telessinalização de avarias, comando e controlo remoto das infra-estruturas e do sistema de comunicações;

6 – Fornecer, instalar, ensaiar e pôr em funcionamento o sistema de radiocomunicações “Projecto Troncas”, com o seguinte equipamento:

1 – Equipamento fixo:

Guia;

Taipa;

Coloane Alto,

Coloane ESFSM;

Comando das Forças de Segurança de Macau (CFSM);

Comandos das Corporações PSP; PMF, Bombeiros;

Subunidades destas corporações;

2 – Equipamento Móvel:

Viaturas auto do CFSM;

Viaturas auto da PSP (Comando e unidades subordinadas);

Viaturas auto de PMF (Comando e unidades subordinados);

Motociclos da PSP;

Vedetas da PMF (Polícia Marítima e Fiscal);

3 – Equipamento Portátil

Viaturas dos Comandos, nas quais o Portátil é destacável do Móvel;

Pessoal do CFSM, PSP, PMF, ESFSM e Bombeiros

4 – Sistema de Rádio troncas – Trabalhando na banda dos 800MHZ.

O sistema de microondas é de baixa densidade, comportando 70 canais e trabalhando na banda dos 2GHz.

O sistema de microondas dá apoio ao sistema rádio troncas por interligação das estações repetidoras de Macau (Guia), Taipa e Coloane. Alem disso, ainda dá suporte a 6 canais telefónicos para interligar a central telefónica da ESFSM (Coloane) com a central telefónica do Quartel de São Francisco (CFSM).

5 – Telessinalização de avarias – O sistema assegura o envio para o Centro de Comando e Controlo dos alarmes e estados de operação a partir das estações remotas seguintes:

– Segurança física (Edifício, Torres, vedações);

– Sistemas de energia (Carregadores, rectificadores, baterias, tensão de alimentação, grupos geradores);

– Rádios (Emissores, receptores, banda base, sistema multiplex);

– Antenas e luz das torres.

d. Funcionamento e principais facilidades

O sistema rádio troncas (Trunking) trabalha na banda dos 800MHz e é um sistema de três Sites (Estações Repetidoras), com capacidade de total cobertura do território e apresenta duas soluções:

a) – 20 canais de voz em cada uma das Estações, todos de cobertura local;

b) – 20 canais na Guia (4C/16L); 12 na Taipa e Coloane (4C/8L), com L= Local e C= Cobertura).

Grupos de conversação

As FSM, pela sua organização precisam de um número elevado de grupos de conversação, configurações e reconfigurações frequentes de acordo com o tipo de missões. Por isso o sistema tem a possibilidade de gerar até 2.000 grupos de conversação.

Identificação: filiação e endereço

Todas as unidades são filiadas no sistema e nele dispõe de uma identificação própria. Cada Rádio que inicie uma chamada enviará a sua identificação e o seu endereço, isto é, dizendo quem é e onde está. Isto permite uma actualização permanente da base de dados do sistema.

Perda de contacto

Sempre que uma unidade se afaste da zona de cobertura ou entre em zona de silêncio e tente o acesso ao sistema recebe um sinal que a adverte dessa situação. Para a hipótese de extravio ou roubo é possível fazer a desactivação remota. A desactivação remota de uma unidade impede de se escutar quaisquer conversações através dela.

e. Consolas, Estações Base, Equipamentos radio-móveis e Portáteis

Consolas do sistema

As consolas do sistema estão situadas no CFSM, na PSP e na PMF, reportando estas últimas, de forma automática, a sua actividade para a do CFSM. Isto quer dizer que, seja qual for a consola que altere o estado do sistema, essa alteração é detectada pelo sistema central. No entanto as consolas “escravas” apenas podem produzir alterações nos estados dos equipamentos das suas próprias frotas.

Estações Base

São estações baseadas das subunidades da PSP (5), da PMF (8), UTIP (Unidade Territorial de Intervenção Pública) (1), BT (Brigada de Trânsito) (1), ESFSM (1), Bombeiros (1) e Bombeiros Ilhas (2).

Estas estações são do tipo “user friendly” e permitem ainda atribuir nomes às operações e às unidades e gerir os seus próprios grupos.

Equipamentos radio-móveis

Os equipamentos radio-móveis são os destinados a ser instalados em viaturas motorizadas e vedetas e trabalham numa pool de canais dentro dos 600 possíveis da banda de emissão de 806 a 821 MHz e na recepção entre os 850 e os 866 MHz, sendo separação entre a emissão e a recepção de 45MHz.

Portáteis

Os portáteis são equipamentos destinados a serem portados pelos agentes e são programáveis e reprogramáveis em campo por software, têm identificação própria, possibilitam chamadas de emergência, possuem “time-out-timer” (temporizador de emissão), sinalizador de descarga de bateria, possibilidade de conversação privada (envolver duas entidades), possibilidade de comunicar no local da acção (sem repetidor), têm acesso à rede telefónica do CFSM, permitem montagem veicular, trabalham em sistema de troncas multi-site e em sistema de troncas básico, etc.

f. Cobertura territorial (troncas multi-site) e cobertura local (tronca básica).

Os canais de cobertura do território são repetidos em todos os sites em simultâneo. Estes canais designam-se por canais de cobertura. Os canais de cobertura local são repetidos apenas nos respectivos sites de forma independente. O sistema usado neste projecto é designado por “selecção simultânea de sites”, situação em que o canal é repetido em cada site numa frequência diferente, para impedir áreas de sobreposição, isto é, para impedir que o rádio receba a mesma mensagem de mais de uma fonte. Cada controlador de cada site tem capacidade para controlar a estação repetidora do site quando em funcionamento local, isto é, separada do sistema multi-site, e para dialogar com o controlador central (Master) em troncas multi-site.

Fig39 - Chamada num sistema multi-site (clique para aumentar)
Fig39 – Chamada num sistema multi-site (clique para aumentar)

Chamadas locais: As chamadas locais são realizadas por canais de cobertura local. As chamadas locais são repetidas num único site, sem ocupação de recursos exteriores ao próprio site.

Chamadas de cobertura: Uma chamada de cobertura estende-se a todos os sites, ocupando em cada um deles um canal. Entende-se por canal um par de frequências de um determinado naipe. Uma chamada de cobertura não ocupa os recursos de qualquer site, destinados ao tráfego local.

g. Descrição de uma chamada de cobertura:

Ao Grupo A pertencem os rádios a1, a2,…a6.

O Rádio a1, situado em Coloane, p.e., inicia uma chamada de cobertura.

O canal de controlo do sistema de Coloane recebe o pedido de canal de voz de a1 e envia-o ao controlador local que o identifica como de cobertura e o envia pelo sistema de microondas ao Controlador Central do Sistema.

O Controlador Central de Sistema dispõe da identificação e da filiação de todos os rádios, interpreta o sinal e selecciona no site de Macau (Guia) um canal de frequência f1 e transmite ao seu canal de controlo local instruções para que os rádios do grupo A passem à frequência f1. Utiliza dois canais de cobertura, um para a Taipa e outro para Coloane. Ordena ao controlador local da Taipa que instrua o controlo local para possibilitar um canal de cobertura de voz, de frequência f2, e que ordene aos rádios do grupo A filiados na Taipa para passarem à recepção nessa frequência. Ordena ao Controlador Central de Coloane que instrua a o canal do controlo local para disponibilizar um canal de cobertura de voz na frequência f3 e que ordene aos rádios do grupo A filiados em Coloane (inclusive a1) para passarem à frequência de recepção f3.

Neste momento um sinal audível avisa o operador de a1 que pode transmitir.

A mensagem de a1 viaja até ao Controlador Central do Sistema que o reenvia a todos aos controladores locais pelo mesmo sistema de microondas através dos canais de cobertura de voz.

Os controladores locais repetem a mensagem pelo canal de cobertura, respectivamente nas frequências f1, f2, e f3, seleccionados localmente. O canal, em cada site, fica cativo enquanto durar a chamada; no fim da chamada o canal regressa à pool.

h. Redundância e avaria grave

O Controlador Central de Sistema é redundante, funcionando um como Master e outro com “Backup”. Na eventualidade de tanto o Master como o back up ficarem inoperativos, móveis, portáteis e estações de base revertem automaticamente para os seus canais de funcionamento predeterminados e continuam a trabalhar como se tratasse de um sistema de troncas por cada site (Básico). Logo que o sistema seja reparado estes rádios são reconduzidos automaticamente à sua condição de funcionamento em Trunking.

7. Projectos de valor acrescentado

Embora em rigor não estejam integrados no Projecto Troncas, decidiu-se avançar para estes projectos de modo a facilitar a sua integração futura no Projecto Troncas. São eles:

a) – Sistema de Atendimento Informatizado das chamadas de socorro, n.º 999;

b) – Projecto de Dados Móveis, em Tempo Real;

c) – Projecto de Controlo de Tráfego Rodoviário.

É sobre este projectos que a seguir me vou debruçar.

A. Atendimento informatizado do nº 999

O 999 é equivalente ao nosso 112, número que, em Macau seria completamente ignorado em situações de pedido de socorro. Os chineses acreditam que os números são portadores de sorte ou de azar. Com a sorte está associado o número 8 e o 9 é neutro. Em compensação a morte está associada ao número 1. Imagine-se um chinês em apuros a ligar para um número que lhe invoca a morte duas vezes seguidas, como é o 112! Daí o 999, contra o qual nada consta. Convém ainda lembrar que Hong Kong já tinha o 999 como número de socorro e que as populações circulando frequentemente de Hong Kong para Macau facilmente contribuiriam para o 999 entrar no uso comum de Macau.

Resolveu-se por isso juntar a informatização do atendimento ao lançamento do número de socorro 999.

A finalidade da informatização é a de agilizar a operação, melhorando o efeito dissuasor sobre a criminalidade, aumentar a protecção da vida e bens e ainda armazenar toda a informação recebida, facilitando o seu tratamento e posterior utilização.

O sistema permite receber pedidos de urgência da rede civil através do 999 (e da rede privativa das FSM) e proporcionar uma activação rápida e eficaz dos meios de socorro, usando o tratamento informático das operações de atendimento e de despacho dentro da sala de operações.

O sistema funciona no centro de operações da PSP e consta de posições de atendimento, posições de despacho e supervisão e base de dados e interligará com a rede pública e coma das FSM.

Para isso, o sistema permite:

– Atender ou responder com mensagens gravadas aos pedidos de socorro;

– Armazenar a informação que recebe, facilitando o seu posterior tratamento e recuperação;

– Aceder à base de dados que contém informação com interesse para a missão (base de dados relacionada com cadastro toponímico, de viaturas automóveis, de pessoas suspeitas, ou cadastradas), etc.

Atendimento automático de chamadas (CAD) = Call authomatic dispatch)

O CAD realiza as seguintes funções:

Recebe as chamadas do 999 e da FS (0999) de forma selectiva, envia cada chamada ao operador que se encontra livre há mais tempo, armazena os dados de cada chamada até à sua passagem ao Despacho, envia mensagens gravadas de resposta-tipo às chamadas que chegam ao sistema, enquanto esperam atendimento.

Despacho

Cada operador de despacho realiza, no mínimo, as seguintes funções: Recebe as chamadas que lhe são enviadas pelo CAD e introduz-lhes os seguintes dados, à medida que a chamada vai prosseguindo:

Activa a função que atribui número à chamada, pelo qual esta passará a ser identificada;

Introduz o tipo de incidente e o lugar onde ocorreu. A hora de atendimento é introduzida automaticamente pelo sistema;

O sistema grava as conversas, os esclarecimentos e as acções tomadas pelo operador de despacho. No fecho da ocorrência acrescenta a informação oportuna.

O atendimento dispõe de sistemas lógicos duplicados, nomeadamente os processadores e as unidades de disco, trabalhando em back up um da outra. O back up executa todos os programas em paralelo com o que está em serviço, de modo que cada um copia para o seu próprio disco tudo que tenha sido executado pelo outro (duplicação ou espelho), detecta quando o que está em serviço apresenta problemas de funcionamento e entra automaticamente ao activo, retribuindo-lhe a informação recolhida no período de pane de forma automática, tornando-se de novo iguais. Cada um destes sistemas é dimensionado para assegurar por si só toda a actividade, na hipótese de pane prolongada do outro.

Distribuição dos meios e cadastro de actuação

Para aumentar a rapidez de actuação, o território divide-se em zonas, quatro na cidade de Macau, uma na Taipa e outra em Coloane. As três primeiras zonas coincidem com as áreas atribuídas às esquadras 1, 2 e 3, respectivamente. A quarta zona fica de reserva. Cada Zona tem listagens de ruas e outros dados toponímicos, numerados do seguinte modo:

Macau Zona 1 Esquadra 1 Números de 1000 a 1999
Macau Zona 2 Esquadra 2 Números de 2000 a 2999
Macau Zona 3 Esquadra 3 Números de 3000 a 3999
Macau Zona 4 Reserva Números de 4000 a 4999
Taipa Zona 5 Esquadra da Taipa Números de 5000 a 5999
Coloane Zona 6 Esquadra de Coloane Números de 6000 a 6999

São exemplos de dados toponímicos cabines telefónicas, edifícios públicos, edifícios com segurança electrónica própria, pontes, edifícios de espectáculos públicos, locais de jogos, rua, praças, etc.

Fig40 - Implementação do sistema informatizado do 999 (clique para aumentar)
Fig40 – Implementação do sistema informatizado do 999 (clique para aumentar)

Tratamento de um incidente (ocorrência)

  1. Chega uma chamada do 999;
  2. O CAD envia-a ao Operador de Atendimento com mais folga, ou dá instruções ao computador que envie o anúncio gravado e coloque a chamada em fila de espera;
  3. O operador de atendimento regista a informação recebida, activa a função automática de número à chamada, introduz o tipo de acidente, lugar onde ocorreu, de preferência o número que corresponde ao código toponímico.

O operador é ajudado por terminais inteligentes e dispõe de e informação tabulada, da qual constam também todas as modalidades delitivas.

4. Feito isto, o incidente apresenta-se disponível ao operador de despacho.

Operador de despacho

  1. Atribui os meios para a resolução do incidente, contando com a lista dos meios disponíveis na zona onde o incidente ocorreu, com a lista de patrulhas a pé, sub-comando com responsabilidade directa onde o incidente ocorreu e conta ainda com os mesmos meios auxiliares de diagnóstico que o atendimento;
  2. Ao fim da operação e depois de indicar o responsável pela sua realização;
  3. Recolhe toda a informação dada pelo responsável pela intervenção, introduz esses dados no seu terminal, activa a função de “acidente encerrado” e activa as funções de “meios libertados”.

B. Sistema de Dados Móveis

O sistema de dados móveis é um subprojecto de valor acrescentado do Projecto Troncas, para funcionamento em todo o território da Macau e consiste essencialmente num sistema que permite que os móveis tenham acesso, recebam informação e reportem para uma base de dados de registo de cadastro automóvel em tempo real, a partir dos locais onde se encontrem a operar no terreno.

O Sistema de Dados Móveis destina-se essencialmente a receber, armazenar, ordenar, modificar e retribuir informação específica da actividade rodoviária controlada pela polícia.

O sistema permite dar acesso, a informação armazenada na base de dados próprias da polícia ou acedidas, pedido a partir dos locais de acção, de onde seja solicitada pelos agentes das FSM.

Permite inquéritos à base de dados sobre dados operacionais. Aceita dados produzidos pelos operadores dos terminais, troca de mensagens electrónicas e difusão de mensagens de alertas ou de alarme.

O seu computador central é dimensionado para suportar a actividade de um efectivo de 3.000 agentes operando no terreno (subunidades das corporações, móveis e portáteis).

C. Sistema de controlo de Tráfego

O sistema de controlo de tráfego destina-se a conseguir, à distância, e por meios electrónicos:

1. Exercer a televigilância de tráfego em pontos de excepcional importância ou de grande movimento;

2. Facilitar a acção dos meios de escoamento de tráfego, quer pela intervenção de agentes de trânsito, quer associado ao controlo de semáforos;

3. Seguir o movimento de viaturas suspeitas;

4. Detectar infracções ao código da estrada e ao uso indevido de viaturas;

5. Registar imagens de ocorrências para posterior consulta e prova.

Fig41 - Implementação do Sistema de Controle de Tráfego (clique para aumentar)
Fig41 – Implementação do Sistema de Controle de Tráfego (clique para aumentar)

O sistema é constituído por:

1. Um número de câmaras de captação de imagem superior a 10, instaladas em locais críticos, assinalados nos desenhos;

2. Uma rede de cabos coaxiais de transporte de imagem desde os locais de captação ao centro de controlo;

3. Uma rede de comando remoto das câmaras e controlo de imagem;

4. Um centro de controlo com monitores (um por câmara) para observação permanente;

5. Um grupo de microprocessadores de controlo para observação detalhada ou sequencial de cada uma das áreas exploradas pelas câmaras;

6. Um sistema de comando remoto, por linhas físicas, para comando das câmaras;

7. Um sistema de registo de imagem.

8. Considerações finais

Termino aqui em passo rápido o que foi o cerne da minha actividade em Macau, estendida por cerca de meia dúzia de idas e vindas. Ainda hoje recordo com saudade a muita e boa camaradagem que por lá encontrei e com uma réstia de angústia aqueles momentos em que é preciso saber fazer bem mas falta, à nossa volta, experiência e escola.
Macau foi talvez o período mais esforçado da minha vida, onde o meu tempo foi contado para tudo e onde me igualei aos chineses a trabalhar 24 horas por dia e algumas à noite. Ao referir as linhas mestras da minha actividade fica na sombra muita outra concorrente para os mesmos propósitos bem como actividades laterais em que a minha presença era chamada a opinar e intervir. Mas isso faz parte da história e não se coaduna com o propósito destas memórias.

Um episódio pouco conhecido

Quando foi para montar o serviço de televisão de Macau, o Governador, Comandante Almeida e Costa, convidou-me para liderar a operação com promessa de permanência em Macau. Desloquei-me a Lisboa e informei o CEME, General Garcia dos Santos, que, suponho, já tinha conhecimento.

Este perguntou-me do meu empenho em aceder ao lugar oferecido. Respondi-lhe que queria aceitar, se tal fosse considerado de interesse para o Exercito e me mantivesse ligado à instituição, condição que não foi aceite. Por essa razão não montei a televisão em Macau, mas fui o responsável pelo SITEP, dado que pouco depois fui promovido a coronel e comecei a comandar o RTm/STM.

1 comentário em “Coronel Cruz Fernandes – Uma notável história de vida (4)

  1. Reparei, com surpresa e desgosto, que este post do coronel Cruz Fernandes “Uma notável história de vida”(4), dedicado à “Missão Macau”, não tinha um comentário sequer, o que contrasta, a meu ver, com a importância que esta narrativa tem para a compreensão da notável modernização das transmissões Permanentes do Exército, a obra a que Cruz Fernandes a seguir se dedicou.
    Sem pretender entrar na apreciação técnica da obra, para a qual a grande maioria dos membros da CHT é mais qualificada para o fazer, vou apresentar um breve, comentário na esperança que outros possam surgir.
    Não tenho dúvidas sobre o sucesso desta vasta obra, de projetar, fazer o caderno de encargos e fiscalizar a execução da montagem do sistema de comunicações das Forças de Segunça de Macau. O reconhecimento deste sucesso e do prestígio ténico do coronel Cruz Fernandes em Macau é claramente mostrado no convite que o Governador de Macau lhedirigiu para continuar em Macau para encabeçar o projeto de instalação da TV .
    A respeito disso apenas duas observações:
    A primeira para dizer que considero que esta passagem por Macau do coronel Cruz Fernandes foi fundamental para o SITEP. Cruz Fernandes já tinha mostrado em Moçambique capacidade técnica quer dentro do Exército quer na sociedade civil.
    Nos quatro anos da sua comissão em Moçambique Cruz Fernandes já tinha dado provas da sua capacidade técnica. A Missão en Macau deu-lhe muito maior projeção e credibilidade externa e junto do Estado Maior.
    Sem esse acréscimo de credibilidade e prestígio técnico do coronel Cruz Fernandes, obtido na Missão Macau não seria possível, a meu ver, o então Chefe do Estado Maior, General Firmino Miguel, aprovar e financiar o SITEP, contra o parecer da maioria dos seus colaboradores mais diretos.
    Mesmo em relação ao coronel Cruz Fernandes, duvido que, se não tivesse estado em Macau, teria a auto confiança suficiente para tomar a iniciativa de propor a realização do Projeto.
    O SITEP surge assim como uma consequência direta de uma progressiva valorização e prestígio técnico alcançado sucessivamente por Cruz Fernandes primeiro em Moçambique e depois em Macau.
    Outra observação diz respeito à decisão do general Garcia dos Santos de não considerar com interesse para o Exército a estadia do coronel Cruz Fernandes em Macau para montar a TV. Foi uma decisão, a meu ver, inteiramente correta, e que abriu caminho para que o SITEP se pudesse realizar.
    Tudo seria diferente se Cruz Fernandes tivesse continuado em Macau, o que poderia perfeitamente ter feito se optasse por não prosseguir a sua carreira militar.
    Ainda bem que não o fez, pois sem o Cruz Fernandes o SITEP seria atrasado uns bons anos, se é que alguma vez se fizesse.

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