Palestra na Universidade do Algarve (só o texto), durante o curso livre “Guerra e Paz – perpectivas contemporâneas“, da responsabilidade do Cor Canavilhas

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Slide2 CV;

Cumprimentos…

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Porquê começar por falar do passado a um grupo de pessoas viradas para o futuro?

Em primeiro lugar, porque a preservação da memória é um dever cívico. Depois, porque a História nos ensina muita coisa, enquanto povo, tal como a experiência pessoal e o conhecimento nos possibilitam melhorar e evoluir, enquanto indivíduos. Finalmente, porque sendo a maioria dos presentes alunos de um curso de Relações internacionais, portanto vocacionados para as áreas de Direito, Sociologia, Economia, História e Ciência Política, achei que seria interessante abordar pelo menos estas ultimas, naturalmente dentro do tema de que vos venho falar.

No livro póstumo Contos (de 1902) – Eça faleceu em 1900 – há um,  com o titulo Civilização, que Eça publicara em 5 episódios na Gazeta de notícias em 1982,  que sempre me encantou desde miúdo e que a maioria recordará, tanto mais que repete muito do enredo no  romance A Cidade e as Serras, publicado em 1901.

Jacinto, um homem novo, muito rico e culto, que vivia luxuosamente, rodeado dos mais sofisticados e recentes inventos e das mais belas obras-primas da literatura, era um homem sempre aborrecido, desanimado, entediado.

Tudo havia de mudar quando decide ir passar uma temporada longe da civilização, num velho solar que herdara em Torges (na Cidade e as serras é em Tormes, no Alto Douro). Antes, enviara todos os equipamentos técnicos e apetrechos que julgava indispensáveis a uma vida civilizada. Contudo, ao chegar, apercebe-se que nem a notícia da sua vinda nem os caixotes tinham chegado a Trás-os-Montes.

Inicialmente desmoralizado e ainda mais pessimista com tamanha “tragédia”, Jacinto é progressivamente cativado pela beleza e simplicidade da vida campestre. E vai ser assim, longe da civilização, dispensando os exageros do luxo, que Jacinto redescobre o prazer e a alegria de viver.

Contudo, o que mais me interessa aqui é trazer-vos um relato do deslumbramento que para muitos foi o aparecimento no séc XIX de muitos dos aparelhos e geringonças que para sempre mudaram a nossa vida.

Civilização – Eça de Queiroz – trechos assinalados nas pág 76 a 84

Faz-nos pensar, não é? Por um lado, a atualidade do Eça, nesta nossa sociedade de consumo e de excessos, por outro, um retrato da curiosidade, mas também da atualidade com que, mesmo em Portugal, se acompanhou o despontar das novas tecnologias no séc XIX. É certo que o Eça passou os últimos vinte e tal anos de vida fora de Portugal, mas manteve as ligações e isso não deslustra nem desvirtua nenhum destes aspectos.

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As Comunicações Medievais

A introdução de novos meios de comunicação em Portugal verificou-se a partir do  início do século XIX, com um atraso mínimo em relação aos países mais avançados. Até então, a evolução dos meios utilizados na Europa foi pouco significativa, mantendo-se os mesmos processos ao longo dos séculos.

Na Idade Média, “a existência de diferentes níveis de comunicação e as atividades da corte régia e instituições do território enxameavam os caminhos de uma imensidão e variedade de agentes encarregados de transmitir notícias e mensagens”.

Para além dos mensageiros, os exércitos necessitavam de usar outros meios, sobretudo em situações de emergência. Os mensageiros eram lentos, mesmo usando o cavalo, até porque a rede estradal era muito fraca. Além disso, só a muito custo podiam ser usados em situações de cerco, muito frequentes na época.

A alternativa, mas apenas para distâncias curtas, era o uso de sinais visuais ou sonoros.

As almenaras ou atalaias, Slide5 pequenas torres situadas em locais altos, permitiam de dia sinais com fumos e de noite com fogo. Fernão Lopes, nas suas crónicas, refere a utilização de almenaras por D. João I e Nun’Álvares entre Lisboa, Almada e Palmela. Aqui ao lado, em Espanha, onde muitas foram construídas desde os árabes até Filipe III, existem ainda algumas em bom estado, por ex em Gata, Huelva, Rincon de la Vitória, etc. Slide6 A anterior era a de Gata, esta é a de Punta Umbria, Huelva, não longe daqui.

Também em Portugal foram largamente usadas, embora hoje haja poucos vestígios em bom estado. Slide7 Nesta imagem pode ver-se a torre sineira frente à igreja de S.ta Maria do Olival, em Tomar, usada como atalaia antes de lhe terem sido acrescentados os dois pisos “sineiros”. Vale a pena referir que esta igreja, iniciada em 1170, data do séc XIII e foi fundada por Gualdim Paes sobre as ruinas de uma primitiva igreja do séc VII mandada construir por S. Frutuoso, bispo de Braga, votada ao abandono durante a ocupação árabe. Slide8 Só como curiosidade, gostaria de referir que esta igreja teve, durante as descobertas, jurisdição da Ordem, portanto dela dependiam as igrejas construídas no ultramar, nomeadamente no Brasil. Já agora, nela só há uma arca tumular, de cerca de 1525, do 1º Bispo do Funchal, terra onde por sinal nunca pôs os pés.

Outros sinais visuais eram usados largamente nos exércitos, que utilizavam bandeiras, estandartes e pendões, nos campos de batalha.

Os sinais acústicos usados eram o toque dos sinos (ainda hoje se usa o toque a rebate em situações de alarme), o rufar dos tambores e os toques de trombeta.

Esta situação, baseada na utilização de meios relativamente simples e tendo praticamente o mensageiro como única solução para distâncias maiores, iria manter-se até ao século XIX sem modificação significativa. A introdução de meios mais complexos viria alterar as formas de comunicar, tanto em tempo de paz como no campo de batalha.

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A Telegrafia Óptica

A introdução da telegrafia óptica, no final do século XVIII, veio revolucionar os meios de comunicação, ao criar uma solução mais eficaz e rápida para comunicações a distâncias consideráveis.

A telegrafia óptica utilizava um conjunto de estações, situadas em pontos altos, cada uma com visibilidade para a seguinte, colocadas a distâncias de cerca de 10 km, mais tarde estendidas até uns 40 km, com o aperfeiçoamento dos óculos de grande alcance. Cada estação dispunha de um dispositivo (semáforo) que permitia a transmissão de sinais, obedecendo a um código. O operador da estação recebia os sinais através de um óculo e reproduzia-os para a estação seguinte, sem precisar de deter o conhecimento do código que, na maioria dos casos, era reservado aos destinatários e aos remetentes, até por questões de segurança.

Slide11 O telégrafo óptico constituiu assim um avanço, pois permitia enviar mensagens a grandes distâncias de forma muito mais rápida, mas tinha condicionamentos, entre os quais o de não poder ser utilizado de noite ou em condições de fraca visibilidade, e o tipo de mensagens que transmitia ser limitado.

Slide12 O telégrafo óptico mais difundido na Europa foi o telégrafo Chappe, criado pelos irmãos franceses Claude e Ignace. Apresentado em 1792 e aplicado entre Paris e Lille numa extensão de 230 km, com 15 estações, logo em 1794 permitiu que a França acompanhasse Napoleão nas suas campanhas europeias, pois chegou a haver conhecimento em Paris de algumas vitórias apenas uma hora depois de ocorrerem. Napoleão, com o seu génio, cedo se apercebeu das suas potencialidades e o começou a usar militarmente, no apoio e no controlo dos seus exércitos.

Em Portugal a telegrafia óptica foi utilizada, a partir de 1803, na ligação do cabo da Roca ao Castelo de S. Jorge, com vários postos intermédios (entre os quais o farol da Guia e a Torre de Belém) para efeitos de aviso da chegada de navios e de controlo alfandegário, como se pode ver nesta gravura da época. Slide13 A chegada de um navio, sobretudo da carreira da Índia, era um acontecimento, quer pelo valor que transportava, quer pela sua cada vez maior raridade, uma vez que se a média anual de saídas para o oriente na primeira década de 500 rondava os 15 navios, excluindo a saída das armadas, a partir do final da época filipina, sobretudo devido ao aumento da tonelagem das naus e galeões, não havia anualmente mais do que umas 3 ou 4 partidas de Lisboa, média reduzida a um único navio no final do séc XVIII. E muitos dos que partiam não voltavam, uns por naufrágio, outros por razões de combates ou de aprisionamento, numa viagem de ida e volta que demorava uns 18 meses. Os arquivos dos armazéns da casa da Índia perderam-se no terramoto de 1755, por isso infelizmente não há registos exatos, mas calcula-se que entre 1500 e 1635 partiram para o Oriente 912 navios, dos quais chegaram ao destino apenas 768. No mesmo período terão partido de lá 550, dos quais apenas 470 chegaram a Portugal.

Slide14 Os primeiros navios do início das descobertas foram as barcas e os barinéis, pequenos navios de cabotagem, de pano redondo, podendo montar remos para as acalmias, utilizados principalmente no comércio, e que só podiam navegar com ventos favoráveis.

A partir de 1440 foi a caravela o navio por excelência das descobertas. Slide15 Herdeira do nome da caravela pescareza, foi contudo um navio novo, desenhado de propósito para a missão. Com cerca de 70 toneladas e dois mastros de vela latina, bolinava bem, o que permitiu projetar a aventura para distancias cada vez maiores, tendo tido a glória de ter sido o primeiro navio a passar do Atlântico para o Indico, com Bartolomeu Dias ao comando de duas caravelas e uma naveta de mantimentos. No final do séc XV já atingia as 100/120 toneladas, armada com três mastros de pano latino, e no séc XVI surge mesmo a caravela redonda, que lhe acrescentava um traquete à vante de pano redondo e ainda com maior tonelagem, até cerca de 200 ton. O armamento da caravela, inicialmente de pequenos calibres, passa, com D. João II, a ser de bombardas grossas, o que, aliado à sua manobrabilidade, lhe confere o estatuto de principal defesa contra os corsários marroquinos e a tornava temida pelas ronceiras e pesadas naus. Chegou a montar 38 bocas de fogo, quando destinada à guerra.

Slide16 A nau era um navio de maior porte, inicialmente com um único mastro de vela redonda. No séc XIII surgiram com castelos de proa e popa, no XIV passa a ter 2 mastros, introduzindo um latino à ré, que aumentam para 3 no final do séc XV, mas sempre com apenas uma vela por mastro. A partir do Séc XVI aparecem mais velas nos mastros grande e traquete, as chamadas velas de gávea, e a sua tonelagem não cessa de aumentar, espantando a Europa. A nau Madre de Deus, capturada pelos ingleses ao largo dos Açores e levada para Dartmouth em 1592, foi aí estudada por peritos navais que, espantados, escreveram que o navio “era muito além do molde dos maiores navios usados entre nós, quer para a guerra, quer para o comércio, pois tinha uma capacidade de não menos de 1600 ton, 900 delas estavam completamente ocupadas com a grande carga da mercadoria, sendo o resto ocupado, em parte, com a artilharia, que era constituída por 32 peças de bronze e o resto com as vitualhas dos passageiros, que não podiam ser em pequena quantidade, considerando que o numero de pessoas a bordo oscilava entre os 600 e os 700. Em altura tinha 7 andares, dos quais 3 eram cobertas fechadas, e 2 nos castelos de dois pisos. O seu comprimento era de 165 pés, ou seja, uns 55 metros, e a verga do mastro grande atingia os 106 pés.”

Estes navios eram inicialmente todos construídos em Portugal, onde só na Ribeira das Naus se empregavam mais de 1500 artífices em 1620, mas muitos também o foram na Índia, onde a qualidade da teca era superior aos nossos pinho e carvalho, fazendo que os navios durassem mais, embora o nosso cordame fosse melhor e mais barato, e também no Brasil, mas em muito menor numero.

Enquanto que os navios cá construídos serviam no máximo para 4 viagens de ida e volta e não duravam mais de 10 anos, um dos mais famosos da Índia, a nau Cinco Chagas, construída em Goa em 1560, serviu na carreira durante 25 anos, tendo feito 9 viagens de ida e volta, além de outros serviços, e tendo servido de navio-almirante de 5 vice-reis. Acabou ingloriamente a apodrecer em Lisboa, como infelizmente foi tão comum, não sem que o Filipe I lhe mandasse retirar a quilha e a mandasse transportar para o Escorial, dada a qualidade que a madeira ainda tinha.

Outros navios portugueses impressionantes da mesma época, criados no inicio do séc XVI especificamente para a guerra, foram os galeões, bem distintos dos galeons espanhóis, que eram navios mistos, enquanto os nossos raramente embarcavam carga comercial. Os galeões portugueses eram navios de bordo alto, próprios para o alto mar, robustos e bem armados, velozes e manobráveis e capazes de transportar cerca de 300 homens de armas e uma tripulação de mais de 100 marinheiros. Com entre as 500 e as 700 toneladas, montavam 40 bocas de fogo ou mais.

Nunca deixará de espantar porque perdemos este avanço tecnológico, esta capacidade inovadora, esta vontade de ir mais longe e melhor. Pelo menos no mar. Hoje em dia levamos mais de 6 anos para construir um simples patrulhão para a nossa Marinha, vemos recusados pelo cliente pequenos navios para ligação inter-ilhas, por falta de qualidades náuticas e assistimos ao encerramento eminente do único estaleiro de construção naval que ainda temos.

Slide17 Até ao séc XIX, as comunicações entre os navios eram incipientes, baseando-se em bandeiras, quer arvoradas, quer manuseadas, ou no envio de escaleres com mensageiros, que muitas vezes eram os próprios capitães dos navios ou os pilotos.

Em terra, de inicio, existia um rudimentar sistema de avisos, desde o Cabo da Roca ao Castelo de S. Jorge, baseado num único mastro em que se usavam combinações de bandeiras, estandartes e um balão para transmitir códigos.

Mas voltemos às comunicações terrestres. Slide18

Em 19 de Novembro de 1807 teve inicio a 1ª invasão napoleónica, comandada por Junot, com os exércitos invasores de Espanha e França a acorreram a Lisboa em marcha forçada. Convém não esquecer a participação espanhola nesta primeira invasão. Depois das goradas tentativas de fazer Portugal participar no bloqueio continental, em Agosto, quer o representante diplomático francês, quer o espanhol, tinham entregue um ultimatum: ou Portugal declarava guerra à Inglaterra, ou um exército franco-espanhol invadia o nosso País. Não esqueçamos também que o Tratado de Fontainebleau, assinado em 29 de Outubro entre a França e a Espanha, dividia o nosso País em 3 partes, ficando o Alentejo e o Algarve, constituídos num principado designado por “Algarves”, a ser entregue ao então primeiro ministro espanhol, Manuel de Godoy, personagem a quem D. João tinha atribuído em 1796 a Grã-Cruz de Cristo. Já agora, Junot também recebera uma em 1805 enquanto foi representante diplomático da França no nosso País. Sempre soubemos reconhecer os nossos amigos… e a história, nisso, não nos tem ensinado muito!

Antes de a família real e a corte embarcarem para o Brasil em 27 de Novembro de 1807, deixando Junot, que chegara a Lisboa a 30, a tempo de, a partir de S. Julião da Barra ainda os ver a sair, donde a expressão “ficar a ver navios”, já Francisco Ciera, com um conjunto de oficiais e soldados, montara e mantivera em funcionamento um sistema de telegrafia óptica para serviço do Regente, que viria a ser o rei D. João VI. Esta rede ligava Lisboa, Queluz, a Torre de Belém e S. Julião da Barra com Mafra, onde o futuro rei passava a maior parte do tempo, o que permitia ao regente manter-se informado e ali “presenciar o que se fazia e fazer mesmo por Sua Mão alguns sinais”, nas palavras de Ciera. Mais tarde, depois do regresso do Brasil, D. João VI mandou instalar novos telégrafos no Alfeite, na Bemposta e em Salvaterra de Magos, que eram residências reais, mas que só trabalhavam quando lá se encontrava.

Francisco António Ciera (1763-1814) matemático e astrónomo, nasceu e morreu em Lisboa, sendo filho do matemático italiano Miguel António Ciera e de mãe portuguesa, uma combinação que pelos vistos produzia bons resultados, como por ex na música, basta recordarmos o contemporâneo João Domingos Bontempo ou o João Baptista Sasseti, de uma família de músicos e editores que veio até hoje, entre muitos outros; foi lente na Academia Real de Marinha, sócio da Academia Real das Ciências de Lisboa e membro fundador da Sociedade Real Marítima; iniciou em 1790 a triangulação geral de Portugal, tendo em vista a construção da carta do Reino; embora ainda incompletos e insuficientes, os trabalhos dirigidos por Ciera marcaram o início de uma etapa nova na Cartografia moderna portuguesa. Slide19 Dedicou-se depois a estudar os telégrafos ópticos de outros países, nomeadamente da França, Inglaterra e o da Suécia, aqui representado, que considerava os menos complexos.

Slide20 Os telégrafos utilizados nessa rede telegráfica da Casa Real foram modelos desenvolvidos por Ciera, o chamado telégrafo português (o de ponteiro, para curtas distancias, e o de palhetas, ou persianas, ou ainda janelas), que tinham a característica essencial de serem muito mais simples e fáceis de operar que os existentes na época, em qualquer outro país. Slide21 O sistema utilizava um dicionário de 60.000 palavras ou frases, também elaborado por Ciera. Estes dois modelos, à escala (1/2 e 1/4), foram apresentados o ano passado pela CHT, de que faço parte, durante as comemorações no RTm do bicentenário do Corpo Telegráfico.

Mas voltemos aos amigos, agora aos “amigos de Peniche”, como o povo batizou os ingleses logo em 1589. Após as derrotas no combate da Roliça e na batalha do Vimeiro, contra forças portuguesas e inglesas entretanto desembarcadas no nosso País sob o comando do futuro duque de Wellington, Junot foi obrigado a render-se e a assinar em 30 de Agosto de 1909 a convenção de Sintra. Nesse documento, onde não é mencionado uma única vez o nome de Portugal nem dos portugueses, os ingleses comprometeram-se a transportar para França o exército francês, com todas as suas armas, bagagens e até 200 cavalos e incluindo o escandaloso saque que por cá fizeram. Convém lembrar que nos tinha sido exigida uma contribuição de guerra de 100.000 cruzados, depois reduzida a 40.000, por se ter verificado que era uma quantia impossível de ser paga, que Junot mandou derreter todo o ouro e prata das nossas igrejas, que os seus soldados saquearam igrejas, conventos, monumentos, túmulos e casas particulares e que Junot levou consigo tesouros nacionais como joias, quadros, bibliotecas e até quase todo o nosso rico museu de história natural, com peças recolhidas em África e nas Américas ao longo de séculos.

Quem tem amigos destes…

Em 1810, data que tem sido apresentada como o início das Transmissões do Exército, foi criado o Corpo Telegráfico, que se pode considerar a origem dos telegrafistas militares em Portugal, destinado a operar os telégrafos instalados. Dependia do Ministério da Guerra e tinha inicialmente cerca de 100 homens no seu efetivo. O seu primeiro Diretor foi precisamente Francisco António Ciera.

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Em 1810-1811, além da rede costeira entre Lisboa e o cabo da Roca, havia já em funcionamento uma outra, com 20 estações, que ia de Lisboa até Almeida, por Santarém, tendo uma ramificação para Abrantes, a partir da Atalaia, e outra para Elvas, a partir de Santarém, com por vezes enormes saltos, como de Almeirim a Montargil (40 Km), ou de Avis a Estremoz (30 Km). Já estive no alto de uma das torres de Avis com uns binóculos potentes e confesso que não consegui entender como conseguiam ver sinais de Montargil, a 24 Km de distancia, quanto mais os de Estremoz. Slide23 Esta correspondência refere-se à construção do ramal de Abrantes, em Junho de 2010.

Além das citadas, havia ainda outras pequenas redes locais, de carácter temporário, como entre os diversos postos de comando militar da Beira Alta, além de alguns telégrafos que foram instalados nas Linhas de Torres.

Os telégrafos utilizados pelo Corpo Telegráfico foram sempre o telégrafo de ponteiro e, sobretudo, o de palhetas ou “persianas”, desenvolvidos por Francisco António Ciera, como já referi. Slide24 O telégrafo de palhetas, aqui representado pelo de Peniche, que serviu durante muitos anos para comunicar para as Berlengas, era constituído por um conjunto de três “persianas” rectangulares de madeira que podiam ser colocadas na posição horizontal ou vertical. Em ambos era possível fazer ao todo oito combinações diferentes, o que permitia utilizar sempre o mesmo dicionário.

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Durante a terceira Invasão Francesa, comandada por Massena, que depois de atravessar a fronteira das Beiras em 24 de Julho 1810 e conquistar Almeida, se dirigiu para Lisboa, apesar de retardado pela derrota no Buçaco, enquanto Soult, que comandara a 2ª invasão, o apoiava no Alentejo, assistiu-se à introdução pelos ingleses de um novo telégrafo óptico, o telégrafo de bolas, nas Linhas de Torres Vedras, sistema fortificado de 3 linhas de defesa que vinha sendo construído desde Outubro de 1809 em absoluto segredo por milhares de camponeses e pelo corpo de milícias português. Slide26

As fortificações e obras de arte militares foram uma total surpresa para os generais franceses e eram de tal modo notáveis que pararam Massena durante um mês, obrigando-o a retirar para posições de retaguarda durante alguns meses e finalmente a empreender a retirada por Espanha, sempre perseguido pelas forças luso-inglesas.

O telégrafo de bolas permitia transmitir números de quatro algarismos. Cada número correspondia a uma mensagem previamente estabelecida e incluída num código. Slide27 O telégrafo compreendia uma verga e uma haste vertical, o mastro. Balões e bandeiras (estas de dois tipos) podiam ser pendurados quer na parte superior do mastro, acima da verga, quer nas cinco prumadas da própria verga, o que permitia representar os algarismos das unidades, dezenas, centenas e milhares.

Este sistema foi montado e operado por marinheiros ingleses, estabelecendo a ligação entre os fortes mais importantes e permitindo a Wellington comunicar com a esquadra inglesa no Atlântico e as canhoneiras que impediam o atravessamento do Tejo na zona dos mouchões. Slide28 Tinha 10 estações nas duas linhas de defesa, 5 em cada. Não há notícia de outra aplicação deste telégrafo no continente.

O mesmo não aconteceu com os telégrafos de palhetas, que se mantiveram ao serviço no continente durante mais de quarenta anos, foram usados pelos miguelistas durante a guerra civil e até pelos liberais nos Açores. Slide29 Neste quadro, em que é retratado o ataque de uma esquadra francesa a Lisboa em 1831, durante as lutas liberais, pode ver-se perfeitamente no topo da Torre de Belém o telégrafo de palhetas com o código 6 introduzido.

No decurso desta guerra civil, com a necessidade de ligar a capital ao exército no Norte, que cercava a cidade do Porto, houve que recorrer à maior rapidez da comunicação que a telegrafia visual oferecia e a dar ao Corpo Telegráfico maior dimensão. A grande realização do período foi a construção da linha Lisboa-Porto, prevista no Regulamento do Corpo Telegráfico de 1828, da autoria de Pedro Folque. As estações desta linha eram as seguintes: Slide30

(Castelo de S. Jorge, Penha de França, Apelação, Monte Cerves, Monte Gordo, Boa Vista, Santarém, Alviela, Golegã, Atalaia, Tomar, Ceiras, Alvaiázere, Monte de Vez, Volta do Monte, Coimbra, Agrêlo, Bussaco, Boialvo, Mortêdo, Vila Nova de Fuzos, A. Branca, Santa Luzia, Souto Redondo, Murado, Canelas, Bandeira e Porto).

Destas 28 estações apenas cinco (Monte Gordo, Bela Vista, Santarém, Alviela e Atalaia) correspondiam a estações já utilizadas na antiga linha Lisboa–Almeida.

Em 1860 o Corpo Telegráfico tinha uma guarnição de mais de 300 elementos.

Na realidade, durante as Guerras Liberais verificou-se também a destruição de inúmeros telégrafos, como por ex. o da Atalaia, perto do Entroncamento e da Barquinha, tendo esta tarefa cabido à guerrilha constitucional, neste caso comandada pelo coronel do exército espanhol D. Manuel Martini: “No dia 24 de Junho de 1833, dei o grito da Liberdade, acclamei o Governo Legitimo, fiz nomear outras Authoridades, soltei os prezos políticos, desarmei a Guerrilha do Corregedor, e hum forte Destacamento de Realistas de Abrantes, amparei-me de 400 armas; e de tarde … marchei para a Barquinha; ao passar, destrui o Thelegrafo da Atalaia…”.

Já nesse tempo, portanto, a destruição das comunicações inimigas era mais um alvo remunerador.

Pela sua parte, os liberais criaram no Porto um serviço de telegrafia visual, que não tem a ver com o Corpo Telegráfico, visto que este se encontrava ao serviço de D. Miguel. Para chefiar o novo serviço dos telégrafos do Porto durante o cerco absolutista da cidade, D. Pedro nomeou o 1º tenente da Marinha Francisco José de Santa Rita, em acumulação com o comando da Companhia de Telegrafistas, destinada a operar os telégrafos integrados na defesa do Porto, com um total de 22 homens.

Também nos Açores o exército liberal estabeleceu o seu sistema de telegrafia visual. Até 1880 mantiveram-se operacionais telégrafos visuais ao serviço das alfândegas, nas ilhas do Faial, Terceira e S. Miguel.

Na Madeira sucedeu algo de semelhante, tendo sido instalada a telegrafia visual mais tarde, em 1836, já depois da vitória liberal, e persistido o uso dos telégrafos visuais até 1879 na Ponta de S. Lourenço, fortaleza do Ilhéu e Pico do Carapau.

Em 1826 e por iniciativa do Governo das Armas do Algarve foi elaborado um projeto para a construção de uma linha de telégrafos na costa algarvia, que começava em Sagres e ia até Tavira, com 19 estações, mas que não teve continuidade. Contudo, em 1832, estava em funcionamento a linha do Algarve, que, com 11 estações, ligava o Castelo de S. Jorge a Sagres, passando por Palmela e Comporta e seguindo aproximadamente a linha da costa.

A rede de telegrafia óptica era apenas utilizada pelos militares e pela Administração do reino, não fazendo serviço ao público.

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A Telegrafia eléctrica

As limitações do telégrafo óptico e o avanço técnico conduziram à sua substituição por outro meio que revolucionou radicalmente as comunicações da época, à escala mundial: o telégrafo eléctrico, o que permitiu que, ligando as estações por fios condutores, as comunicações se fizessem a distâncias onde a visão já não chegava, e a uma velocidade incomparavelmente superior à que a telegrafia óptica permitia. Em pouco tempo a telegrafia eléctrica tornou-se o meio dominante.

De destacar que a primeira experiência de telegrafia eléctrica no país surgiu por iniciativa de duas associações portuenses, uma ligada à Indústria e outra ao Comércio. Aliás, a Associação Industrial Portuense já fora pioneira, ao estabelecer a primeira ligação telegráfica visual privada, em 1835, entre o Porto e a Foz.

Impulsionada por Fontes Pereira de Melo, inaugurou-se em Portugal, em 1855, a nova rede telegráfica eléctrica (em 1838 o americano Samuel Morse patenteara o telégrafo Morse, cuja utilização implicava a utilização do código Morse, também da sua autoria).

Destinada inicialmente ao serviço do Estado, em 1857 abriu ao serviço do público, expandindo-se rapidamente no país. Nesta rede inicialmente utilizaram-se telégrafos Breguet e depois os telégrafos Morse, que acabaram por ser os dominantes. Slide33

O telégrafo Morse compreendia um emissor, a chamada chave morse, a partir da qual o operador enviava sinais constituídos por pontos e traços, de acordo com o código morse. Esses sinais chegavam ao receptor e, ou eram traduzidos em sons que o operador da estação receptora anotava, ou eram inscritos numa fita. O Telégrafo Morse exigia grande prática dos operadores, sendo muito mais exigente, em termos de formação, do que o Breguet. Slide34 Quanto a este, dispunha de dois mostradores circulares, contendo os sinais a transmitir, idênticos na recepção e na emissão, e que continham um ponteiro indicador. A transmissão decorria letra a letra fazendo o operador da estação emissora coincidir o ponteiro com a letra a enviar, que era recebida na estação receptora no respectivo quadrante.

A nova rede foi, de início, operada pelo Corpo Telegráfico, mas em 1864 o Corpo foi extinto, depois de ter assegurado a transição da telegrafia óptica para a telegrafia eléctrica ao serviço do público em geral, passando a rede para a responsabilidade do Ministério das Obras Públicas. O Ministério da Guerra só voltaria a ter uma rede própria a partir de 1873.

Em 1866, no Campo de Manobras de Tancos, realizou-se a primeira experiência de telegrafia eléctrica para uma rede própria do Exército, por iniciativa do Ministro da Guerra, com a patente de capitão de Engenharia, Fontes Pereira de Melo, que foi um dos políticos nacionais mais notáveis do seu tempo.

O oficial que dirigiu estas experiências foi o então tenente Augusto César Bon de Sousa, que chegaria a general de brigada e que viria a desempenhar um papel relevante no desenvolvimento das transmissões no Exército.

Estas experiências não constituíram contudo uma inovação, uma vez que a rede telegráfica eléctrica civil se desenvolvera bastante e, desde 1857, permitia até comunicar com Espanha.

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A primeira rede telegráfica permanente do Exército (1873)

 

Em 17 de Setembro de 1873 foi inaugurada, em Lisboa, a primeira rede de telegrafia eléctrica do Exército, constituída por 13 estações. O Exército Português criava assim transmissões permanentes próprias, que iriam manter-se até ao presente. A data, mais de um século depois, seria escolhida para Dia do Regimento de Transmissões.

As 13 estações da rede eram as seguintes (ver slide37):

(Ministério da Guerra;
Quartel-General da 1.ª Divisão Militar;
Regimento de Infantaria n.º 1, Ajuda;
Regimento de Lanceiros n.º 2 da Rainha, Belém;
Regimento de Artilharia n.º 1, Boa Hora;
Regimento de Infantaria n.º 16, Campo de Ourique;
Regimento de Cavalaria n.º 4, Campolide;
Batalhão de Engenharia, Cruz dos Quatro Caminhos;
Batalhão de Caçadores n.º 5, Castelo de S. Jorge;
Regimento de Infantaria n.º 5, Graça;
Regimento de Infantaria n.º 2, S. João de Deus;
Regimento de Infantaria n.º 7, Torre da Pólvora;
Batalhão de Caçadores n.º 2 da Rainha, Vale do Pereiro.)

Por esta altura foram também estabelecidas ligações telegráficas entre a Praça de Elvas e o Forte da Graça.

O material telegráfico, fornecido pela Direção Geral dos Telégrafos do Reino, era constituído por telégrafos Morse na rede de Lisboa e Breguet na linha de Elvas. A mesma Direção construiu as linhas, assegurou a sua manutenção e deu instrução ao pessoal militar das estações.

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Só que os equipamentos Morse fornecidos eram dos mais antigos que havia na Direção dos Telégrafos civis e os Breguet eram velhíssimos, sendo dos primeiros equipamentos instalados em Portugal em 1855, vindos de França e que aí funcionaram até serem substituídos pelo sistema Morse.

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Usaram-se ainda outros modelos, como este sofisticado telégrafo Hughes, com um teclado para as letras, mas com pouca utilização, dado ser mais caro e mais complexo mecanicamente.

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Pombais Militares

O cerco de Paris, durante a Guerra Franco-Prussiana de 1870, confirmou a vulnerabilidade do telégrafo eléctrico, pela sua dependência das linhas, o que, curiosamente, levou os exércitos europeus já no final do séc XIX a considerarem o pombo-correio como alternativa para situações deste tipo e, em consequência, a promover a organização de redes de pombais militares, desde o tempo de paz, para usar em situações de conflito.

Em Portugal, a introdução dos pombos-correios surge enquadrada neste movimento europeu e resultou da oferta de quarenta casais de pombos-correios das melhores raças belgas, pelo columbófilo belga La-Perre Roo, em 1875, como já fizera para outros países.

Bon de Sousa, que “foi quem primeiro se ocupou seriamente em Portugal de pombos-correios”, publicou em 1888 o livro “Projecto e Instruções para o estabelecimento de Pombais Militares no Continente”. Neste livro refere que, já em 1872, três anos antes da oferta do columbófilo belga, Fontes Pereira de Melo, sendo ministro da Guerra, mandara vir de França uma porção de pombos-correios.

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Os pombos oferecidos por La-Perre Roo foram alojados temporariamente na Torre da Pólvora, em Alcântara, enquanto se construíam instalações definitivas na Penha de França. A obra foi completada em 1880 e as novas instalações foram recebidas por Bon de Sousa, meses depois de ter tomado posse, passando a ser designado por Diretor dos Telégrafos e Pombais Militares.

Através dos pombos-correios a Direção atingiu uma certa visibilidade à escala nacional. Até o rei D. Luís montou um pombal no Palácio da Ajuda e “não houve, durante o tempo em que Bon de Sousa dirigiu estes serviços, exercício militar, visita real ou de ministro sem uma largada de pombos”, tradição que se manteve até há poucos anos em muitas das nossas aldeias e vilas.

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Reintrodução da Telegrafia Óptica

 

A introdução, de novo, da telegrafia óptica, deve-se também à iniciativa de Bon de Sousa e resulta do estudo que fez dos exércitos estrangeiros, publicado nos livros de 1876 e de 1883, onde sobressai o conceito de sobreposição de meios, para superar as vulnerabilidades do telégrafo eléctrico, o meio indiscutivelmente mais rápido e por isso dominante. Bon de Sousa procurou, como se fazia então nos outros Exércitos, montar em Portugal sistemas de telegrafia visual mais modernos, nomeadamente semáforos, lanternas e heliógrafos.

Em 1884, lançou a construção de uma rede de semáforos em Lisboa, com seis estações: Penha de França (Direção dos Telégrafos e Pombais Militares do Continente) e quartéis do Castelo de S. Jorge, Graça, Quatro Caminhos, Vale do Pereiro e Campolide.

Os semáforos permitiam utilizar o código Morse, tornando-se muito mais simples do que o telégrafo de palhetas, anteriormente usado, visto que só tinham que transmitir o ponto e o traço.

A utilização de lanternas de sinais foi proposta pela Direção em 1883, sendo construídas as primeiras quarenta lanternas em 1885, ano em que se realizaram as primeiras experiências e as redes de sinais visuais passaram a ter capacidade para atuar de noite. Slide45

Quanto aos heliógrafos, a rede heliográfica nacional foi montada na sequência da invenção do heliógrafo Martins em 1884, pelo sargento Manuel Martins, grande auxiliar de Bon de Sousa.

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Rede de telefones e Introdução da telegrafia sem fios (TSF)

A primeira rede telefónica militar foi montada em 1904, em Lisboa. Em 1909 havia 180 telefones a cargo da Inspeção, a grande maioria em Lisboa.

As primeiras experiências de TSF em Portugal devem-se ao Capitão de Engenharia Severo da Cunha, do Regimento de Engenharia sedeado no Quartel dos Quatro Caminhos (hoje Regimento de Transmissões) e foram realizadas em 1901, na parada do quartel, com aparelhos emissores e receptores Ducretet-Popov.

Slide48 Nesta imagem podem ver um emissor Redifon, algo posterior, existente no Museu das Tm.

A 17 de Abril do mesmo ano realizaram-se novas experiências entre a Raposeira e o Forte do Alto do Duque, o que foi notícia nos jornais da época.

A TSF tinha evidente interesse militar mas a aquisição de equipamentos para o Exército só viria a verificar-se em 1909 com a compra de quatro estações Telefunken, sendo duas fixas e duas móveis. Slide49 Com as duas estações fixas pretendeu resolver-se o problema das ligações com a margem sul do Tejo. Foram instaladas em Paço de Arcos e Trafaria, em dois barracões provisórios, o que não traduziu grande consideração pelo novo meio que se estava a introduzir. A escolha de material alemão não se revelaria a mais acertada, por a Primeira Guerra Mundial vir inviabilizar a obtenção de sobressalentes, o que não se podia nessa altura adivinhar.

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As transmissões de campanha na Grande Guerra

A forma de participação das transmissões nos teatros europeu e africano foi muito diferente, quer em termos de efetivos, quer quanto à qualidade do material utilizado.

Os efetivos totais presentes na Flandres – Corpo Expedicionário Português (CEP) e Corpo de Artilharia Pesada Independente (CAPI) – foram de cerca de 56.000 homens, enquanto que em Angola e Moçambique, no total das expedições, visto que houve várias para cada uma das colónias, foram respectivamente cerca de 9.000 e 17.000. Ou seja, para França foi mais do dobro do pessoal que foi para África.

No que respeita a equipamento, as tropas portuguesas na Flandres estavam muito melhor equipadas, visto que o material que utilizaram foi fornecido integralmente pelo comando inglês, enquanto que em África era da responsabilidade nacional.

No que respeita à preparação, as transmissões não estavam devidamente instruídas para atuar em nenhum dos teatros. Na frente europeia houve a vantagem da instrução inicial ter sido realizada pelas tropas inglesas, antes de se efetivar a entrada em sector das tropas portuguesas, para além de se ter mantido o apoio inglês durante a guerra. Em África não houve qualquer apoio externo.

Em qualquer dos teatros Portugal combateu contra tropas alemãs, mas na Europa estas eram nitidamente superiores em relação às que guarneciam as suas antigas colónias, onde dispunham de efetivos e capacidade de combate muito mais reduzidos. Por outro lado, desde o princípio da Guerra, as forças coloniais alemãs não tinham comunicações com Berlim porque os ingleses cortaram-lhes as ligações por cabo submarino, nem podiam contar com qualquer apoio em pessoal ou material, dada a superioridade naval dos aliados.

Este balanço leva a concluir que a intensidade da guerra na frente europeia teria necessariamente que ser muito maior, como de facto se verificou. O que pode ser surpreendente é o facto de o número de mortos portugueses na frente europeia ter sido globalmente muito menor, menos de metade, do que em África (na Flandres morreram cerca de 2000, em Angola 800 e em Moçambique cerca de 5000). A explicação é que a principal causa das mortes na frente europeia foi o combate e em África foram as doenças tropicais.

Em relação ao pessoal de transmissões, que se repartiu  por duas unidades, a Companhia de Telegrafistas de Praça e o Batalhão de Telegrafistas de Campanha, morreram na Primeira Guerra Mundial 79 homens, dos quais 25 na Flandres e 54 em Moçambique. Nunca é demais recordar os que dão a sua vida ao serviço de Portugal.

O sistema de transmissões adoptado na Flandres pelas tropas portuguesas era, como disse, o inglês, portanto um sistema evoluído para a época. Obedecia ao princípio da sobreposição de meios, pelo que os meios utilizados eram múltiplos.

Os meios de transmissões utilizados na 1ª GM foram os seguintes:

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  • Telefones, que eram o meio principal e cujo número, no decorrer da guerra, foi aumentando significativamente;
  • Telégrafos;
  • Fullerfones, que eram um misto de telefone e telégrafo que funcionava com corrente contínua, para evitar escutas, com apenas uma linha e ligação à terra;
  • Power-buzzers, que, através de um vibrador, produziam vibrações no solo que permitiam transmitir sinais morse a distâncias relativamente pequenas, a chamada Telegrafia pelo Solo (TPS) e que tinham a vantagem de não necessitar de utilizar linhas;
  • Equipamentos rádio, utilizados sobretudo nos escalões mais elevados, embora houvesse também rádios de trincheira;
  • Semáforos e heliógrafos, quando a distância e a visibilidade o permitiam;
  • Foguetes de sinais, de uso frequente perante a ameaça de gases;
  • Bandeiras de sinais, para distâncias curtas;
  • Mensageiros, incluindo ciclistas e motociclistas.
  • Pombos-correios (os ingleses usaram mais de 10.000)[1];

Slide53 Como os meios mais utilizados eram o telefone e o telégrafo, era indispensável a construção de centenas de quilómetros de linha. A artilharia teve uma larga utilização na guerra, tanto através das flagelações, como sobretudo através das poderosas preparações de artilharia, que antecediam qualquer ataque, e estavam constantemente a cortar as linhas que o pessoal de transmissões tinha a obrigação de reparar, apesar do risco que representava[2].

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A solução para evitar o corte das linhas era enterrá-las. No CEP todos os dias eram nomeados 400 homens para abrir valas para enterrar os fios telegráficos e telefónicos. Nas proximidades do 9 de Abril de 1918, e apesar do esforço feito no sector português, o difícil trabalho de enterrar as linhas estava longe de ser satisfatório.

Na Batalha de La Lys, ao fim de poucas horas, nada funcionava. Esta situação tornou-se inevitável, em face de uma preparação de artilharia de cerca de 150.000 granadas e de um fortíssimo ataque no sector português, coincidente com o dia em que o Corpo iria ser substituído na frente. O colapso das transmissões perante o violento ataque não foi mais que o reflexo da situação geral, não tendo sido surpresa para ninguém.

Slide55 Na imagem, um rádio de trincheira (Museu das Tm)

Apesar de tudo, o pessoal de transmissões saiu prestigiado da Flandres, perante os camaradas das outras Armas[3] e perante as tropas inglesas.

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A Guerra colonial

Com a substituição, em 1958, do ministro da Defesa, Santos Costa, pelo general Botelho Moniz, dá-se a viragem para uma política com prioridade ao Ultramar. Com efeito, a concepção estratégica de Santos Costa dava prioridade à participação de Portugal numa previsível 3.ª guerra mundial, a desencadear na Europa, subalternizando o teatro africano. As tropas das colónias deveriam apenas servir para reforçar, com uma Divisão, as tropas metropolitanas. Dentro deste conceito, em 1954, promoveu uma reorganização das tropas coloniais concentrando-as, em cada uma das colónias, em dois ou três locais.

A nova equipa ministerial fez um estudo estratégico do problema, no qual o tenente-coronel Costa Gomes teve um papel importante, e concluiu que havia necessidade de reforçar e distribuir o dispositivo nos territórios ultramarinos, para o que era precisa uma verba da ordem dos 5 milhões de contos.

Em relação às Transmissões, foi elaborada, em 1959, uma “Directiva” pelo Estado-Maior, na qual se determinava um estudo dos meios de transmissões necessários às antigas colónias, ao mesmo tempo que se atribuía ao projeto uma verba de 40.000 contos. Daqui resultou um notável e circunstanciado Relatório em que a situação das Transmissões existentes nas Colónias era considerada preocupante, com as redes rádio fixas constituídas à base de velhos postos ingleses P-19 e ZC-1, cuja fraca potência conduzia a que as ligações só se pudessem verificar a certas horas do dia e a manutenção ser extremamente demorada. Slide58

A proposta para cada território consistia no estabelecimento de redes permanentes em cada um, definindo as localizações, de acordo com os dispositivos previstos, as potências dos equipamentos a utilizar, as quantidades a adquirir, o seu custo, bem como as instalações e o pessoal necessário. Defendia a necessidade de criar em cada colónia uma secção do STM, e a necessidade de o Serviço manter um controlo centralizado, a exemplo do que fazia a Marinha com sucesso. Este relatório iria também ser a base das aquisições a fazer e permitiu que os oficiais para uma Delegação do STM em Angola aí chegassem em 1960, fazendo com que as transmissões fossem dos poucos que não foram completamente ultrapassados pelos acontecimentos de 1961. Slide59

A ligação entre Lisboa, Angola, Moçambique e Guiné só viria a ser estabelecida uns anos depois, já em plena Guerra Colonial e levaria à construção, a partir de 1961, de um sistema de transmissões em HF que compreendia o Centro Nacional de Transmissões, no Batalhão de Telegrafistas, em Lisboa, o Centro Emissor, na Encarnação e o Centro Receptor, no Campo de Tiro de Alcochete. Foi o tempo dos grandes campos de antenas rômbicas, para propagação por onda reflectida na ionosfera, utilizando equipamentos de elevada potência. Este tipo de propagação exigia um estudo criterioso de frequências de trabalho, diferentes de dia e de noite. A ligação entre Lisboa e Alcochete fazia-se por feixes hertzianos e era afectada pela influência das marés, que alteravam o índice de refracção na zona de propagação.

Através do CNT, dotado de terminais radiotelefónicos, escoava-se não só o tráfego oficial, mas também as ligações particulares dos familiares de militares na guerra, que chegavam a todos os sítios onde houvesse meios do STM. Esta ligação intercontinental representou, assim, um papel fundamental na guerra colonial, pelo apoio às famílias e aos militares.

Alcançar estes resultados obrigou o STM a um esforço considerável que se iria prolongar durante a Guerra Colonial. Foi uma das mudanças mais significativas que se verificaram nas transmissões militares permanentes.

Contrariamente ao que se passou nas transmissões permanentes, nas transmissões de campanha não parece ter havido qualquer esforço visível de preparação para a Guerra Colonial.

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No já referido relatório também era abordado o problema das transmissões de campanha na guerra subversiva, propondo soluções baseadas no critério de admitir que as ligações companhia-pelotão necessitavam de equipamentos com alcance até 10km e as ligações batalhão-companhia, da ordem dos 100km, que em Angola, pelo menos, viriam a revelar-se francamente insuficientes. Propunha a utilização de AN/PRC-10 e de AN/GRC-9 para aquelas ligações, respectivamente, pondo de lado completamente a utilização dos velhos e obsoletos rádios ingleses.

No entanto, em 1961, quando se iniciou o conflito em Angola nada parecia estar preparado. A solução encontrada foi fazer um enorme esforço de recuperação destes rádios, mas que, como seria de prever, para nada serviram, tendo na altura valido a compra por Angola de 160 equipamentos emissores-receptores (E/R) AN/GRC-9. Slide61 Mais tarde foram adquiridos os TR-28, a dorso, o TR-15, normalmente fixo, Slide62 para maiores distâncias, e o AVP-1, Slide63 para curtas distâncias e para contacto com os meios aéreos, que foram os grandes rádios da guerra colonial, conhecidos por todos que por lá passaram.

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Guerra electrónica

A guerra electrónica é o conjunto de medidas, contra-medidas e contra-contra-medidas destinadas a garantir às nossas forças a utilização do espectro electromagnético e a negar ao inimigo, quer essa mesma utilização, quer ações que nos impeçam o seu uso.

Só em 1965, em plena guerra colonial, o primeiro oficial da Arma de Tm frequentou o curso NATO de Orientação de guerra electrónica em Anzio, Itália, na sequência do qual foi criado um Centro de Instrução de GE para o qual foram adquiridos radiogoniómetros (para radiolocalização), receptores de qualidade, e geradores de ruído (para empastelamento), mas durante esta guerra as ações de GE foram limitadas e nunca foram uma prioridade.

Contudo, no 25 de Abril, em que o atual RTm teve um papel fundamental para o sucesso das operações militares, alguns destes equipamentos e sobretudo a experiencia adquirida permitiram proceder a inúmeras escutas, quer telefónicas, quer das redes rádio “In”, e até a tentativas de intrusão.

Nos tempos modernos a GE ganha cada vez mais importância, exercendo-se nas 3 dimensões, terra, mar e ar, e exigindo um cada vez maior controlo centralizado da sua ação.

Mais à frente falarei das duas novas dimensões da guerra moderna.

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As Tm militares do 25 de Abril ao inicio do Séc XXI

Acalmada a situação político-militar com o 25 de Novembro de 1975, o país reorientou a sua estratégia política, recuperando das tentações radicais recentes. O novo poder apontou decididamente para uma reaproximação à NATO e para a entrada de Portugal na Comunidade Económica Europeia (CEE).

Corrigida a rota, perfilava-se a arrumação da grande casa militar, até então organizada para as necessidades de uma guerra de treze anos, que foi crescendo em três frentes – Angola (a partir de 1961), Guiné (1963) e Moçambique (1964) – e que consumia uma grande parte do erário público. A Arma de Transmissões, como as demais, sofreu profundos ajustamentos em pessoal e material, pois havia que proceder, por um lado, à redução de efectivos e de unidades e, por outro, ao reequipamento, face às novas missões.

Foram marcas fortes e condicionantes neste contexto histórico a polémica questão da profissionalização das Forças Armadas, o papel das Forças Armadas como factor político de afirmação externa e o grande desenvolvimento das telecomunicações e da informática.

Instalou-se um Laboratório de Circuitos Impressos (LCI), o primeiro a nível nacional, cuja tecnologia de dupla-face foi posta à disposição da indústria nacional e das universidades. Foi aqui que por ex. se fez a placa de circuito impresso para a “motherboard” do protótipo do primeiro computador fabricado em Portugal – o Sinclair 1000.

Nos anos 80 foi dada prioridade ao projeto e fabrico de um emissor/receptor de VHF/FM, para substituir os velhos equipamentos utilizados na guerra colonial. Foram, assim, fabricados mais de 4.000 E/R PRC-425, portáteis a dorso, e 3.000 para Instalações Veiculares, em diversas versões, incluindo uma com a função de repetidor.

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Seguiram-se, já nos anos 90, os emissores-receptores de HF, VRC-301, para grandes distâncias, os intercomunicadores dos carros de combate, as antenas veiculares e, finalmente, os PRC-501, portáteis à mão, de pequeno alcance, os telefones de campanha BLC-101 e mais recentemente os E/R PRC-525, de 3 bandas (HF, VHF e UHF), em múltiplas versões, com capacidades de GE, GPS e ligação à internet. Importante de referir que todos estes projetos foram feitos em cooperação com a Indústria Nacional, a qual foi também empenhada no desenvolvimento e produção de centrais telefónicas de campanha e permanentes, o que tem sido uma preocupação constante do Exército.

A Arma participou ainda na utilização do PoSAT, terminal de satélite português, da autoria do Professor Carvalho Rodrigues, para comunicações com uma Un de Tm em missão em Angola no âmbito das Nações Unidas, e com as forças portuguesas na Bósnia-Herzegovina.

O SITEP, lançado no inicio dos anos 80, constitui um sistema que permite a integração com os sistemas dos outros Ramos e a ligação aos sistemas de campanha. E foi assim que se lançou o primeiro troço de cabo de fibra óptica em Portugal, entre o EME e o QG/RML, depois prolongado por dezenas de Km em Lisboa e no Porto, e se instalaram as primeiras centrais telefónicas digitais do país. Outras inovações que na altura colocaram a Arma de Transmissões na vanguarda nacional da utilização das novas tecnologias foram os telefones RDIS e o E/R de HF em tempo real. Este, com antenas logarítmicas periódicas instaladas no RTm, permitiu excelentes ligações com as nossas tropas deslocadas no Kosovo e é considerado um último recurso em situações extremas para garantir ligações (em HF) à Madeira e aos Açores.

Outro projeto digno de realce foi o do VIGRESTE (Visualização Gráfica e Estudo do Terreno), iniciado em 1993. Trata-se de uma aplicação informática GIS de simulação e ajuda à decisão.

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Situação actual

Resolvidos que foram os mais prementes problemas com equipamentos de comunicações, o Exército virou-se para os sistemas e para a sua integração.

As TIC – Tecnologias de Informação e Comunicação, que no passado eram apenas usadas como instrumentos de apoio à eficiência dos processos, condicionam hoje decisivamente a geração de valor das organizações, contribuindo para a melhoria não só da eficiência mas também da eficácia organizacional. Seguindo esta tendência, a área CSI assume cada vez mais um papel nuclear na actividade das Forças Armadas, onde a obtenção da Superioridade de Informação é considerada um factor-chave, determinante do seu sucesso ou insucesso operacional.

Entende-se como tal o conjunto de medidas definidas para a Ciberdefesa, mais as que devem ser tomadas para a Segurança das Informações, tal como expresso neste Slide.

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A emergência de novos modelos de interacção global, acompanhada pelos recentes sinais de uma crescente exploração militar do Ciberespaço (os ciberataques conduzidos contra a Estónia – Abril/Maio de 2007 e contra a Geórgia – Agosto de 2008, constituem bons exemplos), tem também um impacto profundo no ambiente estratégico internacional, não só ao nível político, económico e social, mas também ao nível militar. Face à evolução do moderno campo de batalha, as operações militares são hoje conduzidas em cinco diferentes domínios, explorando para esse efeito o espaço terrestre, marítimo, aéreo, espacial (só não está nuclearizado, mas está infelizmente militarizado) e, mais recentemente, o ciberespaço. Dentro deste contexto, este constitui hoje o 5º domínio operacional, materializando uma nova área de planeamento de operações militares. Com a recente criação de um Comando Militar para o Ciberespaço, os EUA passaram a encarar e a assumir o ciberespaço como um novo domínio operacional onde podem vir a ser conduzidas operações militares. Tendo, em Junho de 2009, sido anunciada pelo Secretário da Defesa a criação do U.S. Cyber Command, este novo Comando de Componente declarou ter adquirido a sua plena capacidade operacional em 13 de Novembro de 2010.

A evolução do ambiente operacional e a previsível natureza dos futuros cenários de empenhamento das Forças Armadas, obrigam a rever o paradigma actual, em que a informação não é ainda perspectivada de forma global e integrada, como devia ser, na sua dupla vertente de recurso/arma.

Na Directiva 02/2009 do CEME, a decisão de desenvolver novas capacidades no domínio da informação, como o levantamento de um “Elemento de Guerra de Informação” ou de um “Batalhão ISTAR” (Intelligence, Surveillance, Target Acquisition, and Reconnaissance), contribuindo para a obtenção da Superioridade de Informação do Exército, apresenta importantes desafios, obrigando a uma profunda reflexão sobre a sua utilização operacional.

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O Exército Português, que ao seu sistema de comunicações fixas e permanentes passou a chamar SIC-O, deu início em 2004 a um complexo projeto de suporte às operações centradas em rede através do desenvolvimento de um projeto chamado SIC-T, composto por duas componentes:

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– O SITACO, o Sistema Táctico de Comunicações, que vem sendo desenvolvido por uma equipa militar de projeto nas instalações do Centro Militar de Electrónica;

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– O SICCE, o Sistema de Informação para o Comando e o Controlo do Exército, a ser desenvolvido por uma equipa de projeto sedeada na Escola Prática de Transmissões, composta por oficiais engenheiros que tinham já muita experiência adquirida na programação do sistema de simulação de operações tácticas VIGRESTE, a funcionar no campus do IESM.

Ainda que existam iniciativas e esforços concertados para evitar esse tipo de problemas, subsistem ainda dificuldades em garantir ao nível operacional uma gestão eficaz das diferentes Redes de Comunicações (SIC-O e SIC-T), dos Sistemas de Informação (SIG e SICCE) e até de atividades relacionadas com o combate (ex: GE, ISTAR, Decepção, Contra-Informação e Segurança da Informação), uma vez que a sua exploração se encontra associada a contextos de utilização específicos, facto que leva por vezes à tentação da sua separação funcional, em vez de reforçar a sua integração.

CONCLUSÕES Slide85(=slide1)

O objectivo das Transmissões do Exército é o de responder às necessidades de comunicações do próprio Exército, o que entre nós nem sempre se verificou, sobretudo de inicio. Com efeito, a telegrafia óptica, operada por militares, surge para o Serviço da Casa Real e não para serviço do próprio Exército. Ciera nem sequer é um militar. Mas é um inovador, a nossa tecnologia não é inferior à dos outros povos europeus.

Também o Corpo Telegráfico representou sobretudo a Telegrafia Militar ao serviço da Administração do Reino, e mais tarde ao serviço da própria população, razão porque é também considerado o antecessor dos CTT.

A entrada na GG e na NATO pôs-nos a par das tecnologias mais avançadas na época. A eficiência das Tm na Guerra Colonial e no 25 de Abril são fruto da entrada na NATO.

Depois do 25 de Abril, a introdução de novas tecnologias e avanços tecnológicos e a cooperação com a Indústria nacional só foram possíveis pela nova capacidade “electrotécnica” da Arma, com a mudança dos militares Engenheiros civis para electrotécnicos que teve lugar no inicio dos anos 70.

A capacidade para fazer a guerra prepara-se em tempo de paz e mal andarão os povos que pensem que nunca mais poderão voltar a ver-se envolvidos numa guerra. Portugal tem estado em guerra nestes últimos anos? Não? Mas Portugal tem estado envolvido em guerras, embora nunca declaradas formalmente, integrado em coligações em que alguns países apenas apoiam politicamente, outros com serviços de apoio logístico, outros apenas com algumas componentes, outros com todo o seu potencial de guerra…

A História sempre esqueceu as ferramentas tecnológicas utilizadas pelos estrategas para a conquista dos seus objectivos. Ainda recentemente isso aconteceu no 25 de Abril de 1974. As comunicações foram decisivas para o sucesso do Movimento dos Capitães.

Na Política, nos negócios, na Ciência, na Cultura, etc., e também no campo militar, o espaço físico encolheu: já não são precisas grandes deslocações e grande gastos para comunicar. Os interlocutores, sem saírem dos seus locais de trabalho, podem hoje dialogar presencialmente.

Assim, mais do que nunca, as comunicações são a infra-estrutura tecnológica fundamental para o suporte do campo de batalha moderno e, sobretudo, para o funcionamento da Globalização, materializando a Aldeia Global em que – agora sim – se transformou o mundo atual.

No futuro, o combatente será um sofisticado complexo de comunicações, simultaneamente sensor e beneficiário da informação e do conhecimento em rede.

Uma coisa é certa – o mundo mudou muito desde o séc XV, e mudou de forma vertiginosa, sobretudo nos últimos cem anos.

… Algum comentário final…

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José Manuel Canavilhas


[1] Trecho de André Brun do livro “A malta das trincheiras”, a propósito de pombos-correios:

Deus reserve no seu reino dos Céus o lugar a que tem direito aquele segundo comandante de Brigada, que, servirá esta fama, ao receber de uma Divisão inglesa, no começo da nossa guerra, um cesto daqueles pássaros os mandou cozinhar com arroz, agradecendo em carta ao general britânico e perguntando-lhe onde os comprava, pois tinham sido muito apreciados na Messe”.

Existe uma outra versão da história, em que o gerente de messe do Batalhão de Telegrafistas, perante a ordem do Comandante de dar um bom almoço ao Ministro que visitava a Unidade, apresentou um excelente arroz de pombo. O Ministro gostou e transmitiu o seu apreço ao desembaraçado gerente de Messe. Este respondeu: “Saiba Vossa Excelência que acaba de comer material de Guerra”.

[2] André Brun descreve assim este risco: “Além disso, durante o dia, há sempre um fio velho a levantar, uma linha nova a colocar, um conserto a fazer e os ALICATES (homens de transmissões) lá andam, na lama como os outros, a água pelo joelho pois para sua desgraça os cordéis andam sempre escondidos pelos drenos fora e quando cortam caminho é por clareiras expostas onde se encontra mais facilmente a bala de um sniper boche do que uma nota de cinquenta francos”.

[3] Nova transcrição de André Brun: “Não cavam, nem dão tiros, não vão às patrulhas e nos dias de reserva ou de apoio andam pelos campos, aos molhinhos, fazendo uns aos outros sinais com espelhos e bandeirinhas. No entanto se os rancheiros de oficiais são mal vistos e os impedidos pouco considerados, uma estima especial liga os LANZUDOS àqueles camaradas de alicate porque deles depende e da agilidade dos seus dedos um auxílio oportuno da artilharia e é pelos cordéis que eles estendem que se pedem as represálias e circulam as queixas contra o rancho e todas as reclamações contra o rum que falta”.