Post do MGen Pedroso LIma, recebido por msg:
Numa conversa telefónica recente com o coronel Costa Dias, tomei consciência do pouco que sabia acerca dos sinaleiros na Grande Guerra e do papel que desempenharam no funcionamento sistema de Transmissões do CEP, na Flandres, baseado no sistema inglês.
Na tentativa de melhorar os meus conhecimentos, um dos primeiros livros que consultei intitula-se “Ossadas da Guerra”, da autoria do tenente Rebocho Vaz, publicado em 1921, ano “morno ainda das cinzas do grande braseiro, ainda quente do sangue derramado dos Herois”.
O autor pretende dar uma ideia da vida nas trincheiras em que participou e no qual incluiu o Capítulo “O Sinaleiro”, de 7 páginas .
Da descrição que este subalterno de Infantaria, a Arma mais sacrificada do Exército na guerra de trincheiras, ressalta o enorme apreço e compreensão que revela pela atuação do sinaleiro, na linha da frente das trincheiras, pelos sacrifícios a que foi sujeito e dificuldades que teve que superar.
Permito-me destacar aqui alguns dos pontos com que fundamenta a sua impressão sobre os sinaleiro:
- O local de trabalho do sinaleiro está situado na trincheira “no local onde a experiência criou necessidades, nos diedros das caves abetonadas”. É um abrigo sem conforto, com fendas, onde passa o frio, cheio de humidade, onde lhe ferem os tímpanos os sons que com a instrução, aprendeu a compreender.
- O exercício da profissão isola-o, obrigando-o a uma vida miserável de enclausurado.
- Encontra-se “algemado a uma profissão espinhosa que usufrui e a que o levou uma faculdade que vai rareando nos nossos dias (em 1921) para infelicidades futuras – saber ler e escrever”.
- O sinaleiro precede o Batalhão na entrada para a linha (Para que as transmissões estejam prontas no momento que o Batalhão assume a responsabilidade do seu setor).
- O sinaleiro é dos últimos a sair, quando o Batalhão é rendido ou quando vai para 6 dias de merecido descanso. Enquanto os camaradas vão a correr para os estaminets, onde sabem que as francesas esperam o petit poilu portugais, o sinaleiro tem que passar umas horas a passar o serviço ao seu substituto.
- O autor afirma que “não lhe passou despercebido no flagelo das noites cortantes como o aço, em que o vento sopra incerto, na mais cruel das leviandades, o seu esforço hercúleo a reparar um fio, de ventre espapaçado como uma omelete, com o terreno em que procurara fundir-se como um verme, para evitar uma rajada que persiste bem orientada, em assobios metálicos, nas vizinhanças de Tilkeloy, pavorosa como um fantasma”.
As poucas referências que conheço acerca da participação dos sinaleiros na Grande Guerra confirmam esta impressões.
No que se refere aos riscos que corriam os sinaleiros, André Brum, no seu livro “A malta das trincheiras”, refere o respeito que merecia à malta das trincheiras os perigos que corriam os sinaleiros (por alcunha os alicates) na constante reparação de linhas, de dia e noite, em locais descobertos, e por serem “os senhores que sabem ler e escrever e estiveram várias semanas em escolas a aprender a linguagem do pica-pau: traço-ponto-traço.”
Por outro lado, no livro “Os portugueses na Flandres” do tenente coronel Francisco Freiria, de 1918, refere que nos Raids, ”operações tentadas contra o adversário, num ataque de trincheira a trincheira, visando fazer destruições nas trincheiras inimigas, infringindo-lhes baixas, obter informações, fazer prisioneiros, etc.”, a sinalização era indispensável, nomeadamente para as comunicações para a retaguarda.
Nestas “podem utilizar-se o sistema de sinalização por fachos, foguetes ou very-lights, são contudo melhor assegurados pelo telefone, caso então em que deve fazer parte do raid uma ou mais equipes de sinaleiros”.
No que refere ao isolamento do sinaleiro no seu posto a receber e expedir mensagens, ao contrário do que se verificava no pessoal das outras Armas, integrado em equipes, trata-se de uma caraterística geral dos operadores de transmissões em exploração de redes, o que está bem expresso no livro “A TSF e as Transmissões”, 1938, do então tenente Câmara Pina (1).
De recordar a preocupação que houve na qualidade do serviço no sistema de Transmissões do CEP porque “era necessário manter um apurado serviço de transmissões nos Batalhões de Infantaria e nos Grupos de Artilharia e, como mão dispusessem de suficiente pessoal com as habilitações indispensáveis nem fosse possível prepará-lo com a requerida urgência, houve que recorrer a cabos e soldados da antiga Companhia de Telegrafistas de Praça.” (2)
(1) Ver pág. 109 do livro “As Transmissões Militares da Guerra Peninsular ao 25 de Abril”, onde é transcrito o texto em causa.
(2) Cor Eng Mascarenhas Inglês in Número Comemorativo do III Centenário da Engenharia Militar, pág.208