Post do nosso leitor Sr. João Freitas, recebido por msg:
Vamos hoje tratar de um aparelho praticamente desconhecido, apesar de uma série de fatores que o tornaram único e digno de nota. Mesmo a diversos militares da velha guarda, as nomenclaturas “SCR-593-A” ou “BC-728-A” (1), hoje em dia, já nada dizem.
O “BC-728-A“, (BASIC COMPONENT 728) elemento principal do “SCR-593-A” (SET COMPLET RADIO 593) era apenas um pequeno recetor portátil de amplitude modulada, tendo como comandos quatro botões de pressão para a seleção das quatro frequências pré sintonizadas em oficina, e um outro rotativo que acumulava as funções de ligar / desligar e volume. As quatro frequências estavam compreendidas entre os 2 e os 6 mcs. Podemos dizer que é o único recetor americano de verdadeiro transporte ao ombro, destinado ao serviço militar, muito especialmente à artilharia. Como veremos mais abaixo o aparelho também podia ser aplicado em veículos, seguro a um suporte específico.
Este rádio totalmente autónomo, tinha seis válvulas alimentadas por um sistema com vibrador e possuía altifalante incorporado. Como energia inicial, encontramos no seu interior, uma bateria “BB-54-A“, similar às utilizadas nas motorizadas atuais. A carga desta bateria, era realizada a partir de uma bateria de automóvel de 6 ou 12 v, através de cabos e fichas próprios, e com a ajuda de um outro vibrador (tudo incluído no recetor).
Ligado intrinsecamente ao referido processo de transporte (ao ombro), estava a sua singular antena “AN-75-A”, se não vejamos; a primeira parte da antena era um grosso cabo de borracha preta (com uma proteção em cabedal para o ombro) que, ficando preso pelas suas extremidades ao recetor, servia de alça de transporte. Numa das referidas extremidades estava colocada uma robusta antena telescópica com (aproximadamente) dois metros e dez centímetros de comprimento.
Quando utilizado em “fixo veicular”, o lado da bandoleira que tinha a antena telescópica podia eventualmente ser desaparafusado do corpo do rádio e colocado numa posição convenientemente mais elevada, permanecendo a outra extremidade ligada ao recetor. Um conjunto próprio de acessórios de fixação (2) permitia este uso veicular do recetor, desde que o rádio e a antena pudessem ficar o mais verticais possível. Esta posição era fundamental para o recetor, devido aos cuidados a ter com o ácido da bateria. Tal suporte veicular permitia a fácil extração deste recetor.
A decisão em criar um rádio com alimentação primária baseada numa bateria de ácido/chumbo dita, no futuro, a sua própria morte. Apesar de serem estanques, estes acumuladores vertiam, por descuido ou defeito. O ácido à solta dentro do aparelho, era como um elefante numa loja de cristais. Também a borracha que cobria os quatro botões selecionadores das frequências era de má qualidade e muito fina, deteriorando-se depressa.
Portugal deve ter recebido umas escassas dezenas de unidades (20 rádios, conforme memória de um antigo militar) no início dos anos cinquenta (manual em português de 1958) acompanhadas, naturalmente, por muitos “spares”. Prova disso é termos encontrado, no ano de 2000, largas quantidades de antenas novas ainda embaladas e outro material acessório para eventuais reparações.
João Freitas
(Adaptado de um artigo publicado originalmente na revista “QSP”)
Notas:
(1) A letra “A” na posição apresentada, refere-se já a uma modificação (geralmente impercetível) de qualquer tipo executada naquilo que a sigla anterior (2/3 letras + 2/3 números) verdadeiramente identifica como sendo o básico (o mesmo torna-se válido para as outras letras do abecedário, indicando sucessivas e posteriores alterações).
Quando apresentamos esta especifica identificação, procuramos a que melhor se refira aos modelos que realmente tivemos, em número de exemplares. Não queremos dizer com isso que outros modelos, de menor expressão não tenham de facto sido usados pelo nosso Exército (ex. SCR-593-F).
Será de notar que geralmente os manuais americanos (TM) da serie 11 (material de comunicações), além da sigla identificadora do aparelho a que se destinavam, indicavam logo que se referiam aos rádios com as modificações A, B, C… F, etc., de modo a que o reparador, por exemplo, soubesse que do “B” para o “C”, uma resistência de 1Meg. teria sido alterada para 2. 2Meg.
(2) Sem nos querermos estar a repetir, mais uma vez esclarecemos que a sigla “SCR” (SET COMPLET RADIO) inclui, neste caso: o recetor, antena, bateria, o suporte veicular, cabos de alimentação e todos os parafusos para a fixação do mesmo, tendo cada uma destas peças uma nomenclatura própria. Nesta sequência, ao recetor foi-lhe atribuída a identificação “BC-728” (BASIC COMPONENT 728).
Apenas como curiosidade, podemos observar na frente deste aparelho, duas interessantes marcas. Uma tem a indicação “M.F.P.” a branco, a outra, a encarnado, é um quadrado com um triângulo (de facto é um “A”) inserido no centro. Entre o quadrado e o triângulo existem as letras “S” do lado esquerdo e a letra “C” do lado direito.
Todo o pessoal de transmissões sabe o significado destas duas inscrições, mas como o blogue tem uma “plateia” alargada (esperamos nós!), aqui vai a descodificação destas importantes inscrições.
“M.F.P.” Presente em todos os aparelhos americanos das décadas de 30 a 70, menciona que qualquer artefacto eletrónico foi tratado com um verniz “Multi Fungi Proof”(1) (inibidor de fungos). Transparente quando aplicado (à pistola ou a pincel), amarelece com os anos. É ele que dá aquela cor aos interiores dos aparelhos e o seu cheiro tão característico. Por brincadeira há quem diga que quem o cheira, ao abrir um rádio fechado há muitos anos, nunca mais será a mesma pessoa. Talvez tenha sido isso que me aconteceu…
Este preparado ainda se tornava mais “agradavelmente agressivo” (para quem gosta destas coisas), quando se tinha (e tem!) que usar o inevitável ferro de soldar. Este verniz teria que ser aplicado ciclicamente durante a vida do aparelho, sendo feita nova inscrição mencionando o ano da aplicação (ex. MFP 1953), ou após uma reparação. Realmente temos deparado com rádios que mais parecem uma lata de verniz seco.
Quanto ao símbolo encarnado, não passa do “selo” de aprovação (Approval) do material rádio, por parte do “Signal Corps” (E.U.A.).
1-Existem diversas formas de escrita deste produto.
João Freitas
Este equipamento SCR-593 esteve distribuído á 3ª Div de que fazia parte o BTm 3, onde prestei serviço inicialmente como comandante do Pelotão de TSF da Companhia de Exploração.
Nunca vi o SCR-593, que não existia no BTm3. O senhor João Freitas informou que era “destinado ao serviço militar, muito especialmente à artilharia”.o que foi fundamental na minha tentativa para tentar perceber para que é que os atilheiros se haviam de se interessar por ter apenas um recetor em vez de, como todo o Exército, um emissor/recetor?
Resolvi verificar as redes rádio da Artilhara da 3ª Div (constantes do livro Curso de transmissões para Oficiais de Infantaria , Artilharia e Cavalaria, tomo I) onde encontrei as seguintes apicações para este rádio
. No Comando da Artilharia Divisionária: um recetor na Secção de Observação Aérea para escutar a rede da Artilharia Antiaértea
. Em cada Grupo de Artilharia de Campanha, um recetor no PCT (oficial de operações) e outro na sec de Observação Aérea, ambos ligados á rede de Artilharia antiaérea.
Ou seja no CAD e nos GAC escutava-se o que se dizia na AAA mas não se intervinha.